A Segunda Residência de Vilanova Artigas é a principal casa construída pelo arquiteto João Batista Vilanova Artigas para a sua família em 1949, no bairro do Campo Belo, distrito homônimo, na zona sul de São Paulo.[1] O terreno de 1000m² conta com duas construções que permanecem de pé até os dias atuais – a primeira, de 1942, conhecida como casinha, e a segunda, de 1949, uma construção maior e moderna para a época, que tem caráter mais racional e linhas geometrizadas.[2]
História
A primeira construção do terreno, conhecida como “casinha”, foi criada em 1942, cinco anos após Vilanova Artigas ter se formado arquiteto-engenheiro pela Escola Politécnica de São Paulo, tendo trabalhado com Oswaldo Bratke e Gregori Warchavchik além de também manter sua construtora – Marone e Artigas – através da qual construiu aproximadamente 40 casas até 1942.[3] No entanto, a casinha foi a primeira construída para a sua família, o que trouxe uma liberdade inédita ao projeto. Em 1949, foi erguida a segunda casa no terreno de 1.000m², que enquadrava-se nos contextos da nova arquitetura moderna brasileira. A residência era tão diferente das outras casas do bairro, que, segundo relato de Rosa Artigas, filha do arquiteto, passantes tocavam a campainha para perguntar se ali se situava uma igreja ou fábrica.[4]
A casinha, que foi projetada para um casal sem filhos, é influenciada pela arquitetura organicista de Frank Lloyd Wright (1867-1959), enquanto a segunda residência é relacionada ao racionalismo de Le Corbusier (1887-1965).[5]
A sala da última, que na planta é o local de maior importância, foi palco de importantes discussões intelectuais, como as do Partido Comunista, do qual Artigas era membro, e reuniões do movimento estudantil brasileiro de 1960, feitas por colegas de seus filhos.[5]
Além dessas, Vilanova também projetou o Estádio do Morumbi (1952-1970), a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, e influenciou diversos arquitetos com suas aulas e obras.[6]
Características arquitetônicas
Compacta e econômica, a casa de 1949 expressa o senso de interpenetração social do arquiteto. Os espaços são privados e pequenos, com uma sala de estar integrada a jardim e estúdio em plano elevado. A cobertura é de planos inclinados assimétricos que convergem numa calha única de captação de águas pluviais, solução usada também em outros projetos residenciais do arquiteto.[7]
A divisão se dá por nove espaços, sendo esses garagem, lavanderia, acesso, dormitório, cozinha, sala de estar, estúdio, e a primeira casa da construção.[8] Situado ao lado do living, o terraço é contínuo até o escritório, conectando os espaços e abre-se em três lados para a maior parte do terreno, que é ocupada pelo jardim. O espaço social é volumoso, porém simples, separado do exterior apenas por paredes.[9] O salão de estar possui altas janelas nas duas faces principais que dão vista para o terraço com pé-direito duplo. Essas áreas são ligadas por uma escada que se encaixa harmoniosamente entre os panos de vidro.[10]
O projeto do arquiteto retrata uma construção com telhado em forma de asa de borboleta, com volumes geométricos bem definidos, sala com pé direito alto, janelas grandes com paredes de vidro e coloridas, características da obra do arquiteto que representa tons de amarelo, vermelho e azul.[11]
As paredes que revestem o edifício são de tijolo maciço com cor alterada, geralmente com pintura que não leva reboco nem interna nem externamente, exceto a extremidade do lado esquerdo; o dormitório maior é rebocado externamente e sua pintura é branca.[12] O casarão é todo revestido de vidro, e não possui telhado, como era recorrente nas casas da época, inclusive na Casinha, situada no mesmo terreno. No lugar deste, entra uma cobertura da laje em concreto, no estilo borboleta; internamente, sob a laje, os espaços são contínuos. Não há porta que separe a cozinha dos demais ambientes e nem fundo de quintal. A casa não tem quarto de serviço, rompendo a tradição patriarcal e escravista das moradias paulistanas, e sua garagem é situada ortogonalmente na parte frontal da casa, que não possui muro, apenas uma cerca viva com plantas, marcando os limites com a rua.[4]
A respeito dos materiais utilizados, há uma composição de diferentes matérias, predominando o concreto armado na área da cobertura, enquanto na parte intermediária prevalecem os panos de vidro e ainda, abaixo deles, encontram-se paredes de tijolo a vista. A distribuição da planta nesse espaço passa a ser feita de forma linear.[13]
Significado histórico e cultural
A residência foi tornada patrimônio histórico devido ao significado da produção do arquiteto para a compreensão da história da arquitetura paulista e por sua interpretação característica dos princípios da arquitetura moderna. Além de a casa de 1949 mostrar liberdade projetual em relação aos dogmas do racionalismo, propondo moradias com fluidez dos ambientes e jogo de volumes e superfícies,[14] as duas construções situadas no Campo Belo fazem parte do contexto da residência mínima, que as vinculam com propostas internacionais do movimento moderno e exprimem momento de proposição no panorama do país.[7]
A arquitetura nas obras de Vilanovas também é considerada audaciosa em sua experimentação, e as construções fazem parte do panorama de programa residencial do período de 1938 a 1953 do arquiteto.[14]
A sala da residência pode ser considerada o cômodo mais importante da casa, uma vez que foi cenário de encontros, impulsionados por colegas e pelos filhos de Artigas, que debatiam o movimento estudantil que ocorria na década de 1960. O arquiteto participava também de reuniões históricas do Partido Comunista, realizadas da mesma forma, na sala de casa. O caráter ideológico da construção pode ser verificado pela oposição que Artigas manifestou aos hábitos burgueses, estando ausentes o quarto da empregada e o quintal. Com uma construção moderna e inovadora, era comum que as pessoas da época ficassem surpresas ao passar na frente da casa, confundindo-a até mesmo com uma fábrica ou igreja.[10]
Estado atual
Atualmente, as duas residências permanecem sem grandes mudanças no local, separadas apenas por cerca-viva e tombadas pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico) e pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental), como patrimônio histórico.[5][15] As casas ainda pertencem a familiares, que habitam a primeira residência.
Como patrimônio histórico, na segunda residência, mantem-se a volumetria, fachadas considerando o gabarito e ritmo das esquadrias. Internamente, preserva-se o espaço da sala, terraço e estúdio e circulações, para que haja, como no projeto original, conversação entre os espaços. Também não devem ser alteradas as feições originais que ainda estão preservadas, elementos de composição de fachadas, características externas e volumétricas e vãos e acabamentos. Qualquer mudança pretendida no lote deve ser previamente analisada pelo Condephaat.[14]
↑ abc«Processo de Tombamento»(PDF). Diário Ofi cial Poder Executivo - Seção I. Consultado em 22 de novembro de 2016. Arquivado do original(PDF) em 26 de novembro de 2016