A fonologia do português varia consideravelmente entre seus dialetos, chegando, em casos extremos, a causar dificuldades na inteligibilidade. Este artigo tem como foco as pronúncias consideradas geralmente como padrão. Como o português é uma língua pluricêntrica, isto é, possui mais de um centro de referência, e as diferenças entre o português europeu (PE) e o português brasileiro (PB) podem ser consideráveis, as duas variedades são indicadas sempre que necessário.[1]
Uma das diferenças mais perceptíveis entre o português europeu e o brasileiro é sua prosódia.[2] O português europeu é uma língua de ritmo acentual, com as sílabas átonas de menor duração que as tônicas. As vogais átonas sofrem redução frequente ou até mesmo cancelamento, e há uma tolerância geral a consoantes em fim de sílaba. Por sua vez, o português brasileiro tem características mistas,[3] e varia de acordo com a taxa de fala, sexo e dialeto. Em taxas de fala rápida, o português brasileiro é mais de ritmo acentual, quando em taxas de fala lenta, pode ser mais de ritmo silábico. Os dialetos das zonas rurais do Rio Grande do Sul e da Região Nordeste (especialmente a Bahia) são considerados mais sibiláveis do que os outros, enquanto que os dialetos do Sudeste, como o mineiro, no centro de Minas Gerais, o paulistano da costa setentrional e regiões leste do estado de São Paulo, o fluminense, ao longo do Rio de Janeiro, do Espírito Santo e da Zona da Mata de Minas Gerais, bem como do Distrito Federal, são mais frequentemente essencialmente de ritmo acentual. Além disso, os falantes masculinos do português brasileiro falam mais rápido do que os falantes femininos e falam de uma maneira mais acentual[4] e têm mais redução de vogais átonas e também mais cancelamento.
No português brasileiro há uma forte tendência a sílabas abertas, terminadas por vogal; só há tolerância em fim de sílaba as consoantes representadas por S e R. Nas sílabas terminadas por M e N, essas letras não são pronunciadas e só indicam a nasalização da vogal anterior; o L em fim de sílaba é pronunciado como [u̯] ou [ʊ̯], exceto no extremo Sul (onde há velarização conservadora) e em regiões de fala caipira (onde a pronúncia é /ɹ/); o R final é frequentemente não articulado; e um /i/ epentético é inserido depois de quase todas as outras consoantes que de outra forma estariam em fim de sílaba, fazendo advogado ser pronunciado [ɐdʒivo̞ˈɡadu] ou [ɐdivo̞ˈɡadu] no Nordeste. Os encontros consonantais sempre tolerados no português brasileiro são formados por /b/, /k/, /d/, /f/, /ɡ/, /p/, /t/, /s/ ou /z/ e /v/ seguidos de /l/ ou /ɾ/: flagrante. /ks/ também pode ser incluído nessa categoria: fixo [ˈfi.ksu] (mas não ficção [fikˈsɐ̃w]), látex ['lateks].
Alguns dialetos brasileiros têm características fonológicas mais próximas às do português europeu. Os dialetos fluminense e florianopolitano em particular têm uma redução de vogais maior (assim como quase toda fala vernácula tem comparada à formal), e o dialeto fluminense tem uma tolerância maior a pronunciar róticos em fim de sílaba (representados por R). Enquanto isso, o português africano e muitos dialetos rurais do português europeu apresentam características comumente associadas à fala brasileira. Para mais informações sobre as diferentes variações de sotaque, ver dialetos do português; para as mudanças sonoras ocorridas ao longo da história, ver história da língua portuguesa.
Consoantes
Sinopse
O inventário consonantal do português é bastante conservador; as africadasmedievais/ts/, /dz/, /tʃ/, /dʒ/ fundiram-se com as fricativas/s/, /z/, /ʃ/, /ʒ/, respectivamente, porém não umas com as outras, e não houve mudanças significantes nos fonemas consonantais desde então. No entanto, diversos fonemas consonantais possuem alófonos especiais quando se localizam no início ou final de uma sílaba, e outros passam por mudanças alofônicas quando estão no fim ou início de uma palavra.
¹ Na maior parte do Brasil e de Angola, a consoante designada doravante por /ɲ/ pode ser pronunciada como uma aproximante nasal palatal[j̃] que nasaliza a vogal que a precede: [ˈnĩj̃u].[9]
³ No final das sílabas, as sibilantes/s/, /z/, /ʃ/, /ʒ/ ocorrem por distribuição complementar.[carece de fontes?] Na maior parte do Brasil, são alveolares: /s/ é utilizado antes das consoantes surdas ou no final da palavra, enquanto /z/ é utilizado antes de consoantes sonoras; ex.: isto/ˈistu/, turismo/tuˈɾizmu/.[6] Na maior parte de Portugal, e no Rio de Janeiro e em alguns estados do Norte do Brasil, as sibilantes situadas no final das sílabas tornaram-se palatoalveolares, /ʃ/ antes de consoantes surdas ou no final da palavra, e /ʒ/ antes de consoantes sonoras: isto/ˈiʃtu/, turismo/tuˈɾiʒmu/.[carece de fontes?] No norte de Portugal, as consoantes /s/ e /z/ são ápico-alveolares ([s̺] e [z̺]), sendo que, na parte interior da região, contrastam com [s] e [z], representadas por C/Ç e Z.
5 Os dois fonemas róticos, /ʁ/ e /ɾ/, sofrem contraste apenas quando entre vogais. No início das palavras e depois de /l/, /z/, /ʒ/ e de vogais nasais apenas a primeira ocorre e nos conjuntos consonantais (ex: pr, fr, cr,...) apenas o segundo acontece, enquanto em outras situações a maioria dos dialetos usa apenas a segunda. No entanto, diversos dialetos brasileiros, entre eles o dialeto carioca, utilizam-se da segunda no final das sílabas.
6 A consoante /l/ é velarizada nos dialetos europeus. Na maioria dos dialetos brasileiros, /l/ é vocalizado para [w] no final das sílabas.[6] No português brasileiro coloquial, o il átono pode receber o valor de [ju], como em fácil[ˈfasju].[11]
Notas
As consoantes nasais não ocorrem normalmente no fim das sílabas. O /n/ no fim de sílabas pode ocorrer em palavras de uso mais erudito, por alguns falantes.[10] O /ɲ/ no início de palavras ocorre somente em poucos empréstimos linguísticos.[12]
No norte e centro de Portugal, as plosivas sonoras /b/, /d/ e /ɡ/ podem sofrer lenição e se transformarem nas fricativas [β], [ð], e [ɣ] respectivamente, exceto no início de palavras, ou depois de vogais nasais.[10][12]
Nas pronúncias europeias, as fricativas pós-alveolares sofrem fricção apenas no fim da sílaba.[12]
Pares mínimos
Fonema
Exemplo
Notas
/m/
mato
[ˈmatʊ]
/p/
pato
[ˈpatʊ]
/b/
bato
[ˈbatʊ]
/n/
nato
[ˈnatʊ]
/t/
tato
[ˈtatʊ]
/d/
dato
[ˈdatʊ]
/f/
faca
[ˈfakɐ]
/v/
vaca
[ˈvakɐ]
/s/
caça
[ˈkasɐ]
/z/
casa
[ˈkazɐ]
/ɾ/
pira
[ˈpiɾɐ]
/l/
galo
[ˈɡalʊ]
/ɲ/
pinha
[ˈpiɲɐ]
/ʃ/
chato
[ˈʃatʊ]
/ʒ/
jato
[ˈʒatʊ]
/ʎ/
galho
[ˈɡaʎʊ]
/j/
(vós) sois
[ˈsojs]
Pode-se formar pares entre o [j] de "(vós) sois" com o [i] da conjugação do conjuntivo do verbo soar como em "(que tu) soes".
/w/
(ele) riu
[ʁiw]
Pode-se formar pares entre o [w] de "(ele) riu" e o [u] de "(eu) rio".
/k/
cato
[ˈkatʊ]
/ɡ/
gato
[ˈɡatʊ]
/kʷ/
quais
[ˈkʷais]
Pode-se formar pares entre o de /kʷ/ quais e o /ku/ de (vós) coais.
/ɡʷ/
guano
[ˈɡʷɐnʊ]
Pode-se formar pares entre o de /ɡʷ/ guano e o /ɡu/ de goano.
/ʁ/
rato
[ˈʁatʊ]
Vogais
O português tem uma das fonologias mais ricas das línguas românicas, com vogais orais e nasais, ditongos nasais e dois ditongos nasais duplos. As vogais semifechadas /e/, /o/ e as vogais semiabertas /ɛ/, /ɔ/ são quatro fonemas separados e o contraste entre elas é usado para apofonia. Em posições tônicas, existem alguns cenários em que a vogal central também contrasta entre aberta e fechada, normalmente em conjugações verbais de alguns dialetos europeus, como em "falamos" e "falámos", e também na distinção entre a conjugação enclítica do verbo dar, "dá-nos" /'danus/ e a palavra "danos" /'dɐnus/ (ainda que, nestes dois casos, o principal fator distintivo seja a nasalidade da vogal). Em empréstimos lexicais, como em "rush" que contrasta com "rache", podemos ter uma distinção proporcionada exclusivamente pela diferença de altura entre as vogais.
O português apresenta mudança na altura vocálica como consequência do contraste entre sílabas tônicas e sílabas átonas: as vogais /a/, /e/, /o/ tendem a se tornar, respectivamente, /ɐ/, /ɪ/, /ʊ/ no português brasileiro e /ɨ/ ou /ə/ no português europeu quando átonas, a menos que sofram apagamento. Os dialetos de Portugal são caracterizados pela redução de vogais em proporção maior que os outros. Os ditongos decrescentes seguidos por uma das semivogais /j/ ou /w/; ainda que exista a ocorrência de ditongos crescentes, eles podem ser interpretados como hiatos.
De acordo com a sua pronúncia na palavra as vogais são classificadas em:
Nasalidade
Vogais orais: /i/, /e/, /ɛ/, /ɨ/ (/ɨ/ não no Brasil), /ɐ/ (também /ə/), /a/, /u/, /o/, /ɔ/.
Vogais nasais: /ĩ/, /ẽ/, /ɐ̃/, /ũ/, /õ/.
Grau de abertura
Vogais fechadas: /i/, /ɨ/, /u/
Vogais semifechadas: /e/, /o/
Vogais semiabertas: /ɛ/, /ɐ/, /ɔ/
Vogais abertas: /a/
Semivogais
As semivogais na língua portuguesa são consoantes aproximantes que se juntam a uma vogal para formar uma sílaba (ex.: na palavra mau, a letra u é uma semivogal e a é uma vogal).
Em português, os ditongos crescentes—isto é, aqueles em que a semivogal vem antes da vogal—surgem somente em alguns casos em que a ortografia preconiza usar "qu-" ou "gu-", os quais em nível pós-lexical acrescenta-se o som aproximante [w] após as oclusivas labiais /kʷ/ e /ɡʷ/, à frente da vogal seguinte; porém, também pode ocorrer foneticamente em outras circunstâncias, onde as semivogais ocorrem em variação livre com /i/ ou com /u/, como acontece por exemplo em palavras como quiabo[kiˈabu ~ ˈkjabu], suar[suˈaɾ ~ ˈswaɾ].[13]
/ɐˈnɛjʃ/ (nalguns locais do Centro de Portugal [ɐˈnɐjʃ] )
anéis
/ej/
/'sej/ (nalguns locais do Centro de Portugal [sɐj] )
sei
/ɔi/
/'mɔj/
mói
/oj/
/ˈmojtɐ/
moita
/uj/
/'fuj/
fui
/iw/
/'viw/
viu
/ew/
/'mew/
meu
/ɛw/
/'vɛw/
véu
/aw/
/'maw/
mau
/ɐw/
/'ɐw/
ao
/ow/
/'sow/ (fora do Norte de Portugal muitas vezes [so] )
sou
Ditongos decrescentes nasais
/ɐ̃j/
/'mɐ̃j/
mãe
/ẽj/
/'bẽj/ (nalguns locais do Centro de Portugal [bɐ̃j] )
bem
/õj/
/'põj/
põe
/ɐ̃w/
/'mɐ̃w/
mão
/ũj/
/'mũjtu/
muito
Comparação entre as pronúncias das variantes brasileira e europeia
Esta seção foi marcada para revisão devido a incoerências ou dados de confiabilidade duvidosa. Se tem algum conhecimento sobre o tema, por favor, verifique e melhore a coerência e o rigor deste artigo. Considere colocar uma explicação mais detalhada na discussão.(Dezembro de 2016)
A pronúncia da língua portuguesa, como ocorre em todas as línguas naturais, apresenta uma grande variação. Especialmente marcante é a diferença entre o português europeu e o brasileiro. A tabela abaixo exemplifica algumas dessas diferenças, tendo como base a ortografia:
Visto a língua portuguesa não conter uma ortografia do tipo "uma letra para cada som", como por exemplo o croata, uma letra pode ter mais do que um único som, como a letra "x" que apresenta cinco sons distintos.
↑PARKINSON, Stephen. "Phonology". In HARRIS, Martin; VINCENT, Nigel (org.) The Romance Languages. Londres: Routledge, 1988. p. 131–169.
↑Bisol, leda, PUCRS - O Troqueu Silábico no Sistema Adjudicatário De Plínio Barbosa)
↑MEIRELES, Alexsandro; TOZETTI, João Paulo; BORGES, Rogério. Taxa de fala e variação rítmica no português brasileiro In: Speech Prosody 2010 Conference, 2010, Chicago. Proceedings of the Speech Prosody 2010 Conference. Chicago: RG. v.1. p.1 – 4, 2010
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↑Leda Bisol (2005). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro 4ª ed. Porto Alegre - Rio Grande do Sul: EDIPUCRS. p. 122. ISBN85-7430-529-4. A proposta é que a sequencia consoante velar + glide posterior seja indicada no léxico como uma unidade monofonemática /kʷ/ e /ɡʷ/. O glide que, neste caso, situa-se no ataque não-ramificado, forma com a vogal seguinte um ditongo crescente em nível pós lexical. Ditongos crescentes somente se formam neste nível. Em resumo, a consoante velar e o glide posterior, quando seguidos de a/o, formam uma só unidade fonológica, ou seja, um segmento consonantal com articulação secundária vocálica, em outros termos, um segmento complexo.
↑Thomas, Earl W. (1974), A Grammar of Spoken Brazilian Portuguese, Vanderbilt University Press, ISBN 0-8265-1197-X
↑ abcMateus, Maria Helena & Ernesto d'Andrade (2000), The Phonology of Portuguese, Oxford University Press, ISBN 0-19-823581-X
↑Major, Roy C. (1992), "Stress and Rhythm in Brazilian Portuguese", in Koike, Dale April & Macedo, Donaldo P, Romance Linguistics: The Portuguese Context, Westport, CT: Bergin & Garvey, ISBN 0-89789-297-6 (em inglês)
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Maria Cecilia Mollica (2008). Processing and morpho-semantic effects in complementation in Brazilian Portuguese (em inglês). Rio de Janeiro: Cambridge University Press. doi:10.1017/S0954394500000570
Ana Paula Huback (2011). Irregular plurals in Brazilian Portuguese. An exemplar model approach (em inglês). [S.l.]: Cambridge University Press. doi:10.1017/S0954394511000068
Fernando Tarallo e Mary A. Kato (2008). Filling syntactic boundaries in spoken Brazilian Portuguese (em inglês). Campinas: Cambridge University Press. doi:10.1017/S0954394500001423
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