Em 1912 Roquette-Pinto fez parte da Missão Rondon e passou várias semanas em contato com os índios nambiquaras que até então não tinham contato com a civilização.[1] Na volta, trouxe vasto material etnográfico e, como resultado dessa viagem, publicou em 1917 o livro Rondônia - Antropologia etnográfica, considerado um clássico da antropologia brasileira. Seus estudos sobre os tipos antropológicos do Brasil ganharam destaque por demonstrar que a miscigenação racial brasileira não havia produzido "tipos raciais" degenerados ou inferiores. Ao contrário. De acordo com as suas pesquisas, a população mestiça brasileira era saudável e eugênica, o que refutava os tradicionais estigmas raciais produzidos por cientistas e viajantes que passaram pelo Brasil desde o século XIX, ou mesmo por setores das elites intelectuais brasileiras. De acordo com a antropologia de Roquette-Pinto, o grande problema dos brasileiros não era a raça, mas sim as questões sociais e políticas, sobretudo a falta de educação e saúde pública.[3]
Foi diretor do Museu Nacional da UFRJ em 1926,[4] organizando ali a maior coleção de filmes científicos no Brasil.
Em 1932, Getúlio Vargas aprovou a lei sobre a obrigatoriedade da exibição de filmes nacionais e Roquette-Pinto criou o Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE). A pedido do ministro da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, convidou o diretor Humberto Mauro para trabalhar com ele. Humberto filmou mais de trezentos documentários de curta-metragem, entre 1936 e 1964.[5]
Edgar Roquette-Pinto também é homenageado pela Academia Brasileira de Médicos Escritores como patrono da cadeira 33, cujo fundador é o médico urologista paulista Helio Begliomini.
Primeira rádio do Brasil
No ano que comemorou o I Centenário da Independência do Brasil, ocorreu no Rio de Janeiro, então capital federal, uma grande feira internacional, que recebeu visitas de empresários americanos trazendo a tecnologia de radiodifusão para demonstrar na feira, que nesta época era o assunto principal nos Estados Unidos
Para testar o novo meio de comunicação, os americanos instalaram uma antena no pico do morro do Corcovado (onde atualmente é o Cristo Redentor). A primeira transmissão radiofônica no Brasil foi um discurso do presidente Epitácio Pessoa, que foi captado em Niterói, Petrópolis, na serra fluminense e em São Paulo, onde foram instalados aparelhos receptores.[1] A reação de Roquette-Pinto a essa tecnologia foi: "Eis uma máquina importante para educar nossopovo".[6]
Depois da primeira transmissão no Brasil, em 1922,[7] Roquette Pinto tentou convencer o governo federal a comprar os equipamentos apresentados na Feira Internacional.
Três anos depois, em 1926, a Rádio Sociedade lançou a revista Eléctron, dedicada à recém surgida tecnologia do rádio com diagramas de receptores da época, tendo Roquette Pinto como diretor. Foi a primeira revista desse segmento no Brasil.[9]
Em 1936, doou a emissora ao governo brasileiro, especificamente ao Ministério da Educação, transformando-a na Rádio MEC.
Roquette-Pinto também foi radioamador e participou de várias associações da categoria, como a Liga dos Amadores Brasileiros de Rádio Emissão (LABRE). Em 1937 sua estação detinha o indicativo SB1AG.[10]
No Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia
Foi organizado em comemoração ao centenário da Academia Brasileira de Medicina e presidido por Roquette-Pinto e Renato Ferraz Kehl. O evento ficou marcado como um dos principais congressos de eugenia da América Latina, tendo reunido importantes figuras da comunidade intelectual brasileira e latino-americana. No início dos anos 1930, no auge das discussões sobre controle eugênico da imigração, dos matrimônios e da natalidade, eugenistas brasileiros fundariam a Comissão Central Brasileira de Eugenia, criada com o objetivo de assessorar o governo e as autoridades públicas em assuntos relacionados ao aperfeiçoamento eugênico da população.[11]
Na censura
Em 1936, os aparelhos de rádio já podiam ser comprados em lojas do ramo. Nesse mesmo ano, a Sociedade Rádio do Rio de Janeiro foi doada ao Ministério da Educação e Saúde (MES), que tinha como titular Gustavo Capanema, que comunicou a Roquette-Pinto que a rádio seria incorporada ao Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (mais tarde, em 1939, deste departamento surgiria o DIP), órgão responsável pela censura durante parte da era de Getúlio Vargas.[1]
Em resposta, Roquette-Pinto insistiu que a rádio fosse incorporada ao Ministério da Educação e Saúde, com o fim de preservar a função educativa. Roquette Pinto ganhou a disputa. A rádio Sociedade passou a se chamar Rádio Ministério da Educação, ou como é conhecida rádio MEC, mantendo, até hoje, o ideário educativo. Consta que, ao se despedir do comando da emissora que fundara, sussurrou chorando ao ouvido da filha Beatriz: "Entrego esta rádio com a mesma emoção com que se casa uma filha".
Tentativa de TV Educativa
Com o objetivo de pluralizar o número de emissoras na capital federal - as TVs Tupi de São Paulo e do Rio já estavam em funcionamento -, Getúlio Vargas concedeu-lhe um canal de televisão em 14 de maio de 1952. Porém, a TV Educativa de Roquette-Pinto nunca conseguiu sair do papel. Apesar de planejada nos mínimos detalhes, de possuir financiamento devidamente aprovado pela Câmara Municipal do Distrito Federal e dos seus equipamentos terem sido comprados e embarcados no porto de Nova York, de onde deveriam seguir para o Brasil, eles nunca saíram de lá. Perdido o financiamento, Edgar Roquette-Pinto morreria amargurado dois meses após o suicídio de Getúlio Vargas.[12]
Legado
No campo intelectual, o nome de Roquette-Pinto esteve estreitamente associado ao campo da antropologia física e da etnografia, tendo dedicado mais de trinta anos de trajetória ao estudo das populações brasileiras. Em 1911, participou do Primeiro Congresso Universal de Raças, realizado em Londres, no qual entrou em contato com grandes nomes da antropologia internacional. Em 1912, realizou uma importante viagem antropológica para a região da Serra do Norte, na entrada da Amazônia, no norte do Mato Grosso. Como resultado dessa viagem, publicou em 1917 o seu diário de viagem, intitulado "Rondônia: Antropologia-Etnografia", obra na qual narrou o seu contato com a população indígena e sertaneja da região. A viagem também inauguraria uma série estudos que antropólogo realizaria nos anos seguintes sobre as características das populações brasileiras. Seus estudos ficariam marcados pela defesa da miscigenação racial e da população mestiça brasileira e por uma forte crítica ao determinismo racial e biológico.[13]
Roquette-Pinto também está entre os mais importantes intelectuais brasileiros que se empenharam na organização e divulgação do movimento eugênico brasileiro, juntamente com Monteiro Lobato, Belisário Penna e Octávio Domingues e Renato Kehl.[14][15] Dificilmente se situará como um "eugenista", na linhagem de Renato Kehl (ver abaixo, Primeiro Congresso Brasileiro de Eugenia). Já se falou dele como defensor de uma "eugenia positiva", como um intérprete da mestiçagem brasileira que não significava, a seu ver e na contracorrente dos eugenistas europeus -- uma "degeneração".[16] Como um crítico do racismo científico, Roquette-Pinto entendia que a eugenia deveria ser investida para melhorar as condições físicas e mentais de toda população brasileira, sem excluir negros e mestiços do processo de aperfeiçoamento da nação brasileira. Neste aspecto, o antropólogo se insurgiu contra a "eugenia negativa" e o racismo praticado por figuras como Renato Ferraz Kehl, que propunha medidas radicais de intervenção eugênica, como a segregação racial e a esterilização eugênica.[17]
Obras
O exercício da medicina entre os indígenas da América (1906)
Excursão à região das Lagoas do Rio Grande do Sul (1912)
Publicou também grande número de trabalhos científicos, artigos e conferências entre 1908 e 1926, em diferentes revistas e jornais.
Notas e referências
Notas
↑O nome do escritor, segundo as normas ortográficas vigentes, deve ser grafado Edgar Roquete-Pinto
Referências
↑ abcde«Edgard Roquette-Pinto». Academia Brasileira de Letras. Brasil Escola. Consultado em 31 de outubro de 2012
↑Trindade Lima, Nísia; Miranda de Sá, Dominichi (2005). Antropologia Brasiliana: ciência e educação na obra de Edgard Roquette-Pinto. Rio de Janeiro: Fiocruz. ISBN85–7541–070–9 Verifique |isbn= (ajuda)
↑Edgar Roquette Pinto, pag. 1290 - Grande Enciclopédia Universal - edição de 1980
↑A bem da verdade, a primeira emissão radiofônica do Brasil ocorreu no Recife, com a Rádio Clube de Pernambuco, em 6 de abril de 1919, noticiada um dia depois no Jornal do Recife, periódico já extinto. (Ver Mais velha que o rádio
).
↑Apesar de ter sido considerada a primeira rádio do Brasil, ela foi criada 4 anos depois da Rádio Clube de Pernambuco, que, embora tenha sido noticiada e conhecida sua criação e radiodifusão, não tinha apoio oficial.
↑Braga, Newton C. (março–abril de 2022). «Revistas do passado». Revista INCB Eletrônica (9): 42
↑SOUZA, Vanderlei Sebastião de. A política biológica como projeto: a “eugenia negativa” e a construção da nacionalidade na trajetória de Renato Kehl (1917-1932). Dissertação de Mestrado (História das Ciências), Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz, 2006.
↑Souza, Vanderlei Sebastião de (2011). Em busca do Brasil: Edgard Roquette-Pinto e o retrato antropológico do Brasil. (Tese de Doutorado em História). Rio de Janeiro: Casa de Osvaldo Cruz, fiocruz