O massacre de Deir Yassin foi um assassinato em massa de civis palestinos desarmados,[1] ocorrida na vila de Deir Yassin (também grafada Dayr Yasin ou Dir Yassin), nas proximidades de Jerusalém, no que então era o Mandato Britânico da Palestina, cometida pelas forças terroristas judaico-sionistas (Irgun e Lehi) entre 9 de abril e 11 de abril de 1948. As estimativas geralmente aceitas pelos estudiosos,[2][3] calculam a matança de entre 107 e 120 civis palestinos desarmados durante e possivelmente após a invasão armada judaica.[4][5] Teriam ocorrido enquanto as forças judaico-sionistas conseguiram romper o cerco a Jerusalém, durante a guerra civil que antecedeu o fim do Mandato Britânico da Palestina, em maio.
Relatos contemporâneos de Mordechai Ra'anan, que era um dos oficiais que comandaram desde Jerusalém uma das forças irregulares envolvidas (o Irgun),[6] davam uma estimativa inicial de 254 mortos.[7] O número elevado de vítimas teve um impacto considerável no conflito que já ocorria na região, ao criar pânico e se tornar uma das principais causas do êxodo palestino de 1948.[7][8]
O massacre foi condenado universalmente à época, inclusive pelo comando do Haganá e da Agência Judaica.[9]
Cronologia do massacre
O muktar (ou prefeito) de Deir Yassin havia feito um acordo de não-agressão com os judeus dos assentamentos vizinhos e, apoiado nesse acordo, havia negado permissão para que forças árabes usassem a cidade como base. A população da localidade chegou a lutar ao lado dos judeus contra bandos árabes que queriam usar a vila como base militar.
Em abril, comandantes locais dos grupos terroristas Irgun e Lehi (ou Stern Gang) procuraram o comandante da Haganá em Jerusalém, David Shaltiel, desejando tomar parte na operação destinada a abrir um corredor entre Jerusalém e Telavive. Embora receoso, Shaltiel acabou por autorizar o ataque, embora argumentasse que haveria outros motivos mais valiosos do ponto de vista militar. A operação foi chamada de "Unidade", por reunir numa só ação os três setores das forças judaicas — Haganá, Stern e Irgun —, embora a primeira entrasse, a princípio, apenas com apoio "logístico" e armamentos, além de enviar um "observador", o jovem oficial Meir Pa'il. Nos dias seguintes, os líderes dos dois grupos terroristas reuniram-se para planejar o ataque, que visava "quebrar" o moral árabe e criar pânico entre os árabes palestinos. Segundo um comandante da Irgun, a maioria dos comandantes presentes às reuniões "decidiu pela liquidação de todos os homens da aldeia e quaisquer outros que se opuséssem a nós, mesmo que fossem velhos, mulheres ou crianças".
Na madrugada o dia 9 de abril de 1948, a força de assalto sionista, com 120 homens, aproximou-se da aldeia. Os sentinelas, armados com velhos rifles turcos, alertaram a população, que rapidamente começou a fugir para as aldeias vizinhas, enquanto alguns homens faziam frente aos invasores. No começo, os sionistas fizeram pouco progresso; segundo o observador da Haganá, Meir Pa'il: "Eles conseguiram ocupar apenas a metade oriental da aldeia, não conseguindo ocupar a parte ocidental. Dez ou doze árabes atiravam contra eles usando apenas rifles, não tinham armas automáticas, e seguraram-nos do lado oriental", sem conseguir atingir alvo algum. Mesmo com tão poucos defensores árabes em Deir Yassin, os invasores sionistas tiveram dificuldades em prosseguir a operação, fazendo com que o próprio Pa'il enviasse um mensageiro a uma base próxima da Haganá solicitando reforços. Logo, um pelotão da Palmach (a força elite da Haganá) chegou aldeia, ocupando-a em poucos minutos e sem nenhuma baixa em nenhum dos lados. Com a vitória, o pelotão da Palmach retirou-se, deixando as ações sob responsabilidade dos comandantes terroristas.
O que se seguiu na aldeia foi a mais brutal selvageria, e embora até hoje a literatura sionista e israelense divida-se quanto aos seus motivos e consequências, há unanimidade entre historiadores árabes e ocidentais, e entre observadores de organizações humanitárias, de que o que houve em Deir Yassin foi uma matança deliberada e cruel da população civil com o objetivo de atemorizar os habitantes de toda a região e provocar sua fuga. Anos depois, o jornal judaico-americano Jewish Newsletter relatou:
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Depois que os homens da Haganá se retiraram, membros da Irgun e do Grupo Stern perpetraram as mais revoltantes atrocidades: 254 homens, mulheres e crianças árabes foram massacrados a sangue frio e seus corpos mutilados foram atirados em um poço; mulheres e moças árabes capturadas e trazidas para Jerusalém em caminhões e conduzidas em parada pelas ruas, onde eram humilhadas e cuspidas. No mesmo dia, os irgunistas deram uma entrevista à imprensa na qual disseram que a matança coletiva era uma "vitória" na guerra de conquista da Palestina e da Transjordânia.
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Para completar a ocupação, os terroristas jogavam granadas pelas portas das casas e metralhavam indiscriminadamente a todos os que viessem pela frente. Mulheres tiveram suas barrigas rasgadas por baionetas, e crianças foram mortas em frente a suas mães. Uma comissão britânica que entrevistou sobreviventes alguns dias depois, conclui que "muitas atrocidades sexuais foram cometidas pelos atacantes judeus; muitas mulheres foram estupradas e depois trucidadas. Mulheres idosas também foram molestadas". Alguns corpos foram encontrados com mais de 60 tiros, ou com membros mutilados. Quinze casas foram dinamitadas, incluindo a casa do muktar, enquanto as demais foram saqueadas.
De acordo com o médico da Cruz Vermelha, Dr. Jacques de Reynier, de origem suíça:
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A limpeza foi feita com metralhadoras e depois granadas de mão. Foi terminada com facas, qualquer um podia ver isso.
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O médico suíço ficou particularmente chocado por uma das terroristas que segurava uma faca.
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Uma bonita jovem israelense com olhos criminosos, mostrou-me uma faca com sangue ainda pingando, ela me mostrava aquilo como se fosse um troféu.
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O comportamento dos terroristas sionistas lembrou o Dr. Reynier de seu serviço durante a Segunda Guerra Mundial, quando lhe veio a mente uma cena em que viu "um jovem nazista apunhalar um casal de velhos sentados em frente de sua cabana".
O saldo do massacre foi de centenas de civis palestinos mortos, grande parte constituída por crianças, mulheres e idosos. Os sobreviventes fugiram aterrorizados, abandonando a aldeia e disseminando o pânico entre a população palestina.
Repúdio internacional
Mais de vinte intelectuais judeus proeminentes condenaram o Irgun e o Lehi por sua participação no massacre de Deir Yassin em uma carta aberta ao The New York Times. A carta foi assinada por mais de vinte intelectuais judeus proeminentes, incluindo Albert Einstein, Hannah Arendt, Zellig Harris e Sidney Hook.[10]
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Um exemplo chocante foi o comportamento deles na vila árabe de Deir Yassin. Essa vila, fora das estradas principais e cercada por terras judaicas, não participou da guerra e até lutou contra bandos árabes que queriam usar a vila como base. Em 9 de abril, bandos terroristas atacaram essa vila pacífica, que não era um objetivo militar na luta, mataram a maioria de seus habitantes (240 homens, mulheres e crianças) e mantiveram alguns deles vivos para desfilar como prisioneiros pelas ruas de Jerusalém. A maioria da comunidade judaica ficou horrorizada com o ato, e a Agência Judaica enviou um telegrama de desculpas ao Rei Abdalá da Transjordânia. Mas os terroristas, longe de se envergonharem de seu ato, estavam orgulhosos desse massacre, o divulgaram amplamente e convidaram todos os correspondentes estrangeiros presentes no país para ver os cadáveres amontoados e a devastação geral em Deir Yassin.
Durante os últimos anos de violência antibritânica esporádica, os grupos I.Z.L. e Stern inauguraram um reinado de terror na comunidade judaica da Palestina. Professores foram espancados por falarem contra eles, adultos foram baleados por não deixarem seus filhos se juntarem a eles. Por métodos de gangsters, espancamentos, quebra de janelas e roubos generalizados, os terroristas intimidaram a população e exigiram um pesado tributo. Dentro da comunidade judaica, eles pregaram uma mistura de ultranacionalismo, misticismo religioso e superioridade racial.
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Referências
↑Kana'ana, Sharif and Zeitawi, Nihad (1987), The Village of Deir Yassin, Bir Zeit, Bir Zeit University Press
↑Milstein, Uri (1998) [1987]. History of the War of Independence IV: Out of Crisis Came Decision (em hebraico e versão inglesa traduzida e editada por Alan Sacks). Lanhan, Maryland: University Press of America, Inc. ISBN0-7618-1489-2 !CS1 manut: Língua não reconhecida (link): Capítulo 16: Deir Yassin, Seção 12: The Massacre, página 377
↑Milstein, Uri (1998) [1987]. History of the War of Independence IV: Out of Crisis Came Decision (em hebraico e versão inglesa traduzida e editada por Alan Sacks). Lanhan, Maryland: University Press of America, Inc. ISBN0-7618-1489-2 !CS1 manut: Língua não reconhecida (link): Capítulo 16: Deir Yassin, Seção 12: The Massacre, pág. 376-381
↑Benny Morris, The Palestinian Refugee Problem Revisited, Cambridge University Press, 2004 p.294 n.566
↑ abMilstein 1999, p.388 ("the leaders of ETZEL, LEHI, Hagana and MAPAM leaders had a vested interest in spreading the highly inflatedversion of the true facts") and pp.397-399.
↑Morris 2004, p.239: "IZL leaders may have had an interest, then and later, in exaggerating the panic-generating effects of Deir Yassin, but they were certainly not far off the mark. In the Jerusalem Corridor area, the effect was certainly immediate and profound."
↑Sachar, p.333: "The most savage of these reprisal actions took place on 9 April 1948 … the deed was immediately repudiated by the Haganah command, then by the Jewish Agency" Morris 2001, p.208: "the Jewish Agency and the Haganah leadership immediately condemned the massacre".
↑Isidore Abramowitz; Hannah Arendt; Abraham Brick; Rabbi Jeshurun Cardozo; Albert Einstein; Herman Eisen; Hayim Fineman; M. Gallen; H.H. Harris; Zelig S. Harris; Sidney Hook; Fred Karush; Bruria Kaufman; Irma L. Lindheim; Nachman Maisel; Seymour Melman; Myder D. Mendelson; Harry M. Oslinsky; Samuel Pitlick; Fritz Rohrlich; Louis P. Rocker; Ruth Sagis; Itzhak Sankowsky; I.J. Shoenberg; Samuel Shuman; M. Singer; Irma Wolfe; Stefan Wolfe (4 December 1948). «Letters to The Times: New Palestine Party: Visit of Menachem Begin and Aim of Political Movement Discussed»(PDF). The New York Times. Consultado em 3 August 2011Verifique data em: |acessodata=, |data= (ajuda) !CS1 manut: Nomes múltiplos: lista de autores (link)