Pesquisador de reconhecimento internacional, Kerr foi o responsável por desenvolver um novo tipo de espécie de abelha, denominada "africanizada", que é mais dócil e grande produtora de mel. Também descobriu um tipo de alface com 20 vezes mais vitamina A do que o comum.[4][5]
Kerr nasceu em Santana de Parnaíba, em 1922. Era filho de Américo Caldas Kerr, descendente de escoceses, e de Bárbara Chaves Kerr. Seu pai veio de uma família bastante numerosa, dezoito irmãos, e cursou até o segundo ano de engenharia. Porém, com a morte de seu pai, ele precisou largar a faculdade e começar a trabalhar.[9] Em 1925, a família se mudou para a cidade de Pirapora. Alfabetizado em casa por sua mãe, fez o primeiro ano na Escola Mista de Pirapora e o segundo e o terceiro na Escola Particular do Rasgão (Usina da Light), onde seu pai era o diretor da usina.[2]
Ficou em Pirapora até os doze anos, mas aos oito anos já gostava de observar a natureza e principalmente as abelhas sem ferrão. Em casa, já fazia experimentos científicos pouco elaborados, apoiados pelos pais. Da usina, seu pai o mandou para um internato na capital, que Kerr não gostou. Ele então se mudou para uma pensão que pertencia à família do jornalista, escritor e produtor cultural Cornélio Pires. O então curso ginasial e o preparatório para engenharia foram cursado no Instituto Mackenzie, na capital paulista.[9]
Por sua inclinação para a pesquisa científica, seu pai sugeriu que ele fizesse engenharia. Mas Kerr tinha um colega que sempre visitava Piracicaba e falava muito bem da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ). Um dia Kerr foi com o amigo para o interior para conhecer a escola e se apaixonou pelo lugar, principalmente a coleção de insetos.[9]
Em 1942 ingressou no curso de agronomia da ESALQ. Inicialmente Kerr não gostou do curso de entomologia, mas começou a gostar depois de ter aulas de genética. Empenhado na disciplina, começou a trabalhar aos sábados começando com as abelhas. Levou algumas de suas observações para o entomólogo Herman Lent, do Museu Paulista de Zoologia. Lent se animou com as pesquisas, dizendo que suas descobertas eram inéditas e sugeriu que as publicasse. Em seu último ano de curso, publicou suas primeiras pesquisas na revista O Solo.[9]
Formado em 1945, no ano seguinte ingressou no doutorado em Genética Animal sob a orientação de Friedrich Gustav Brieger, de quem foi assistente de cátedra.[9] Doutor em 1948, defendeu junto a tese de livre-docência para concorrer à 19ª cadeira de citologia e genética da instituição.[2][3]
Demitiu-se do cargo em 1964, um mês antes do término de seu mandato, a fim de criar o Departamento de Genética da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Além de organizar o departamento, Kerr também se empenhou em fundar instituições com os mesmos objetivos da Fapesp em outros estados brasileiros.[12][13]
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, desempenhou essa função de 1969 até 1973, período marcado pelas inúmeras crises entre o governo militar e a comunidade científica e universitária, o que levou a SBPC, sob a liderança de Kerr, a uma clara postura de repúdio às arbitrariedades praticadas pela ditadura. Foi preso duas vezes (em 1964 e 1969).[14]
Com a repressão na ditadura militar, acabou sendo preso duas vezes e chegou a sofrer ameaças à sua numerosa família de sete filhos, tanto por sua atuação à frente da SBPC quanto por denunciar, em suas aulas, arbitrariedades do regime, como a tortura de uma freira em Ribeirão Preto.[15]
Entre 1975 e 1979, transferiu-se para Manaus para reorganizar o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, o Inpa, com forte apoio de Jose Dion Melo Teles, então presidente do CNPq. Ao chegar no Amazonas, no Inpa trabalhavam apenas um mestre e um doutor. Ao sair do Inpa, a instituição contava com cinquenta mestres e sessenta doutores, quatro cursos de pós-graduação e 233 pesquisadores.[16][17]
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O que fizemos foi mandar para o sul ou para o exterior todo o pessoal aproveitável para fazer mestrado e doutorado. Também contratamos pessoal local ou de outras regiões, e até mesmo no exterior.[16]
”
Depois de aposentar-se da USP em janeiro de 1981, Kerr foi para o estado do Maranhão, onde permaneceu oito anos. Além de criar o Departamento de Biologia na Universidade Federal do Maranhão, foi reitor da Universidade Estadual do Maranhão. Kerr recebeu o título de Professor Honoris Causa da Unicamp em 2005[9] e da UFMA em 2017[18]. Em 1999, foi chamado de volta a Manaus para dirigir o Inpa por mais três anos.[2][11]
Após terminar suas atividades no Maranhão, Kerr foi convidado a continuar suas pesquisas na Universidade Federal de Uberlândia. Embora aposentado, ao completar setenta anos, em 1992, orientou alunos na pós-graduação, deu aulas de Genética dos Hymenoptera e realizou suas próprias pesquisas até o ano de 2012.[19]
Em 1956, Kerr foi à África, com apoio do Ministério da Agricultura, estudar a produção de mel do continente, para mais tarde aplicar seus conhecimentos ao Brasil. A pesquisa visava melhorar a produtividade das abelhas europeias introduzidas em 1839[21] introduzindo abelhas africanas mais adaptadas ao clima quente como o do Brasil. Quando retornou, trouxe por volta de 50 rainhas africanas (da espécie Apis mellifera scutellata, altamente produtiva e agressiva). Rainhas e operárias foram postas em quarentena em uma floresta de eucalipto de Rio Claro (SP), para que apenas as menos agressivas fossem escolhidas.[22][23]
As colmeias eram fechadas por uma malha que permitia a passagem de operárias, mas não de rainhas. Um erro na colocação das malhas permitiu que 26 rainhas fugissem. As abelhas enxamearam—se reproduziram—e os pesquisadores perderam o controle sobre elas. De 1957 até 1964 essas abelhas cruzaram-se com as alemãs, italianas e portuguesas. Porém, houve um grande problema: os apicultores colocavam seus apiários próximos aos galinheiros, pocilgas, cocheiras. Houve mortes de galinhas, porcos, cavalos, e as mortes de pessoas, cerca de 120 por ano, passou para 180.[10][23]
A partir daí, Kerr se dedicou a estudar a genética da produção e da agressividade dessas abelhas. Com apoio dos pesquisadores da USP, criou técnicas de manejo mais adequadas e desenvolveu a abelha africanizada, um híbrido das espécies européias (comum no Brasil) e africana. Além de mais mansa e bastante produtiva, a africanizada se mostrou resistente à varroa (praga que destrói colméias) e permitiu aos apicultores produzir o mel orgânico, onde não é necessário o uso de agrotóxicos.[22][23]
Depois disso, Kerr passou a ser reconhecido por pesquisadores e respeitado pelos apicultores.[10][24]
Vida pessoal
Kerr era casado com a professora Lygia Sansigolo Kerr, com quem teve sete filhos: Florence, Lucy, Américo, Jacira, Ligia Regina (professora titular da Universidade Federal do Ceará, Tânia e Hélio Augusto (falecido em 2005), que lhes deram 17 netos.[25]
Morte
Kerr estava internado em um hospital de Ribeirão Preto e morreu em 15 de setembro de 2018, aos 96 anos, devido a uma parada cardíaca.[6][26] Ele foi velado no Cemitério da Saudade, seguido de uma cerimonia de cremação.[27]
Homenagem
Em 2003 o Inpa instituiu a Medalha Warwick Estevam Kerr, oferecida a pesquisadores que se prestam relevantes serviços à pós-graduação na Amazônia.[7]
↑KERR, Warwick E. ; CARVALHO, G. A. ; SILVA, A. C. ; ASSIS, M. G. P., ed. (2001). «Aspectos pouco mencionados da biodiversidade amazônica»(PDF). Parcerias Estratégicas. pp. 20–41. Consultado em 20 de janeiro de 2023 !CS1 manut: Nomes múltiplos: lista de editores (link)
↑Maro Coelho e Warwick E. Kerr, ed. (2005). «A Amazônia, os Índios e as Abelhas»(PDF). Revista Estudos Avançados. 19 (53): 51-69. Consultado em 20 de janeiro de 2023