Um Filme Falado

Um Filme Falado
Portugal Portugal/ França/ Itália
2003 •  cor •  96 min 
Género drama, comédia
Direção Manoel de Oliveira
Produção Paulo Branco
Coprodução RTP, Madragoa Filmes (Portugal), Gemini Films (França), Mikado (Itália)
Roteiro Manoel de Oliveira
Elenco Leonor Silveira
Filipa de Almeida
John Malkovich
Catherine Deneuve
Stefania Sandrelli
Irene Papas
Luís Miguel Cintra
Michel Lubrano di Sbaraglione
François Da Silva
Nikos Hatzopoulos
António Ferraiolo
Alparslan Salt
Ricardo Trêpa
David Cardoso
Júlia Buisel
Distribuição Atalanta Filmes (Portugal), Gemini Films (França)
Idioma português, inglês, francês, italiano, grego

Um Filme Falado (2003) é um filme português de Manoel de Oliveira que, pelo título e pela forma, explicitamente ilustra a assumida teatralidade do seu modo de fazer cinema.

O modo teatral dos seus filmes é manifesto sobretudo desde O Acto da Primavera (1963), mantém-se na sua segunda longa-metragem de ficção, O Passado e o Presente (1971), não sem sofrer o ataque de críticas severas, e só nos seus filmes seguintes – justificado por abundantes considerações teóricas de comentadores e críticos –, é assumido e decididamente cultivado como forma de conteúdo.

A questão (a do filme "falado") é aqui implicitamente retomada e explicada pelo próprio Oliveira.

O filme estreia a 15 de outubro em França e a 17 de outubro de 2003 em Portugal.

Sinopse

Rosa Maria (Leonor Silveira), professora universitária de História, embarca num cruzeiro, com destino a Bombaim, na Índia, juntamente com a sua filha, Maria Joana (Filipa de Almeida), com a finalidade de se irem encontrar com o marido de Rosa, que é aviador.

Rosa escolhe ir em cruzeiro, pois assim teria oportunidade de visitar lugares de que falava todos os dias aos seus alunos. Passam por Marselha, Nápoles e Pompeia. Visitam Atenas, onde são guiadas por um monge ortodoxo (Nikos Hatzopoulos). Visitam o Cairo, onde se cruzam com um português que não conheciam (Luís Miguel Cintra). Passam ainda por Istambul.

Quando se dirigem para o Golfo Pérsico, conhecem três personalidades importantes, Delfina (Catherine Deneuve), uma empresária francesa, Francesca (Stefania Sandrelli), uma cantora italiana e Helena (Irene Papas), professora e atriz grega. Travam também contacto com o comandante do navio, John Walesa (John Malkovich), um norte-americano de origem brasilo-polaca. Pela sua ascendência brasileira, fala um pouco de português e assim se entende com Rosa Maria e sua filha Maria Joana, à qual oferece uma boneca.

Nessa noite, Walesa organiza uma pequena festa com Delfina, Helena e Francesca, convidando também Rosa Maria e Maria Joana. Porém, a meio da festa, um segundo oficial (Ricardo Trepa) avisa o comandante que o navio corre sério perigo: existem duas enormes bombas-relógio a bordo. Pouco falta para explodirem.

É accionado o alarme de emergência: todos os passageiros e tripulantes correm em grande confusão para os botes salva-vidas. Maria Joana esquece-se da boneca no quarto e decide voltar atrás para a ir buscar. A mãe vai com ela. Quando querem abandonar o navio já os botes salva-vidas se tinham ido. O bote do comandante e dos oficiais fora o último. O segundo oficial sabe que as duas mulheres tentam abandonar o navio. Walesa entretanto ordena que as vão buscar, mas o segundo oficial avisa que já não é possível, pois faltam poucos segundos para a explosão.

Walesa grita em vão dizendo às mulheres para saltarem para a água. Ouve-se duas explosões. Os clarões projectam-se no rosto dos oficiais. Aterrorisado, Walesa vê o que não queria ver.

Enquadramento histórico

Uma professora de história em viagem de cruzeiro pelo Mediterrâneo segue a trama da civilização, vista como utopia do mundo actual. A linguagem criadora de civilização, a contradição de ser português – o mais universalista dos europeus, o único que não fala a própria língua fora do seu país – ilustram a realidade da União Europeia.

Na verdade, o filme encara não a linguagem como acção criadora da civilização, mas sim o conjunto das acções humanas (a linguagem sendo apenas uma delas), sejam elas boas ou más, as fontes criadoras do processo civilizacional. Processo esse não-linear, contraditório e muitas vezes extremamente violento. Nesse sentido é eloquente o diálogo entre a mãe e a filha quando a primeira faz referências às guerras sucessivas, religiosas e económicas que acabaram por fundar o substrato cultural, não-homogéneo, do continente europeu, em que elementos da cultura greco-romana, árabe e de várias religiões se misturam, e que seus respectivos povos ao longo dos séculos cultivaram. A linguagem aparece como elemento contraditório pois ela é, em primeira instância, a marca da diferenciação. Em segunda instância, (quando o processo civilizacional consegue avançar e as pessoas passam a compreender outras línguas que não a sua própria língua) assinala a possibilidade de real integração entre as pessoas e realidades culturais diferentes. O que o filme ilustra é exactamente o momento de ruptura entre os povos, pela incapacidade de se fazerem entender apenas através da língua.

No filme, não é o português o mais universalista dos europeus. Essa pretensão Manoel de Oliveira, do alto de sua imensa sabedoria, não a almejou. Muito pelo contrário. Ao discutir o papel da Grécia na formação da Europa e da própria civilização ocidental, a personagem que no filme representa a cultura helénica aponta a contradição: apesar dessa dívida imensa do mundo moderno aos gregos, a sua língua hoje em dia só é falada na própria Grécia. Ou seja, a linguagem, que num primeiro momento foi o veículo da transmissão dos ideais gregos de democracia, humanismo e filosofia, a partir de determinado instante perdeu importância, embora os valores por ela transmitidos tivessem perdurado.

Nenhum povo é mais ou menos universalista do que outro. Todos dão contribuições para o processo civilizacional, a partir de diferenças e de experiências culturais específicas. É o assunto da conversa no restaurante, ao jantar, entre um americano, uma francesa, uma italiana e uma grega. Todos falam nas línguas pátrias e todos se entendem. Aliás, diz a professora, o português é falado não apenas num lugar, em Portugal, mas em várias e populosas regiões do mundo: na América do Sul, na África e na Ásia.

Não é a realidade da União Europeia a questão que o filme aborda mas, de forma bem mais ampla, a questão presente no mundo contemporâneo, a do choque civilizacional entre as culturas hegemónicas no mundo ocidental e no mundo árabe, o radicalismo crescente entre grupos representativos desses universos culturais.

Elenco

Prémios e nomeações[1]

Festival de Veneza

Ano Prémio Resultado
2003 SIGNIS Award Vencedor
Leão de Ouro Nomeado

Festivais

  • Em 2003:
  • Festival de Veneza (juntamente com Brumas, de Ricardo Costa)
  • Festival de Montréal
  • Festival de Toronto
  • Festival de Chicago
  • Festival de Haïfa
  • Festival de Huelva – Competição Oficial
  • Festival de DaKINO (Bucareste)
  • Festival de Salónica (Grécia)
  • Festival de Kerala - Índia
  • Em 2004:
  • Festival de Bangkok – Tailândia
  • Festival Internacional de Filmes Latinos – Toronto
  • Festival de «Black Nights» - Estónia
  • Festival de Bratislava
  • Festival de Belgrado Sérvie e Montenegro
  • Festival de Mar del Plata
  • Festival de Hong Kong
  • Festival de Istanbul
  • Festival de Gwangju - Coreia
  • Festival de Lituânia
  • Festival de Munique
  • Festival de Frankfurt
  • Festival de Copenhaga
  • Festival de Baltic Pearl - Letónia
  • Festival de Toronto
  • Em 2005:
  • Prémio «Olas de Oro» - Cinema RNE Sant Jordi (Espanha)

Ver também

Referências

  1. Prémios (em inglês)

Ligações externas

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