O sistema de Lotka-Volterra, desenvolvido na década de 1920, constitui-se de duas equações diferenciais que de modo geral descrevem a interação entre duas populações, geralmente, uma população de presas e outra de predadores. [1] Esse sistema em sua forma básica pressupõe que existe alimento em abundância para as presas e que os predadores são extintos na ausência destas. Esta simplicidade provoca restrições ao modelo, por isso, na tentativa de torná-lo mais realístico alterações podem ser realizadas, sendo comum sua adaptação ao modelo Logístico, [2] e o uso do cálculo fracionário, [3] mas existem diversas outras modificações possíveis.
O modelo de Lotka-Volterra fracionário [4] visa atenuar algumas limitações do modelo básico, como crescimento exponencial das presas na ausência do predador, a extinção de predadores na ausência das presas, falta de complexidade ambiental como a movimentação aleatória de ambas as populações em um meio homogêneo, entre outros.
As equações de Lotka-Volterra foram desenvolvidas de modo independente, pelo biofísico Alfred J. Lotka (1880-1949) e pelo matemático Vito Volterra (1860-1940). Dada a forma do surgimento das equações, o modelo foi chamado de Lotka-Volterra. O desenvolvimento das equações por parte de Volterra se deu a partir de estudos acerca da interação entre certas populações de peixes no mar adriático, quanto a Lotka, este analisava a dinâmica de drosófilas. O primeiro livro sobre biologia matemática, Elements of Mathematical Biology, tem autoria deste último. [5]
O cálculo fracionário, ou de ordem arbitrária, originou-se no século XVII, a partir de uma pergunta formulada numa troca de correspondências entre Leibniz e L'Hôpital. Numa destas correspondências, Leibniz o questiona sobre a generalização da derivada de ordem inteira para uma ordem a princípio, arbitrária, ao que L'Hopital lhe devolve a pergunta com pedido de esclarecimento sobre qual seria sua interpretação de uma derivada de ordem 1 / 2 {\displaystyle 1/2} na notação de Leibniz, d 1 / 2 y / d x 1 / 2 {\displaystyle d^{1/2}y/dx^{1/2}} . Desde então, muitos matemáticos e pesquisadores, tem contribuído para este campo, sendo que atualmente suas aplicações adentram campos do conhecimento como Matemática, Física, Química, Biologia entre outras áreas.
Sejam a , b , c {\displaystyle a,b,c} e d {\displaystyle d} constantes positivas. Considere por simplicidade que, x = x ( t ) {\displaystyle x=x(t)} denota a população de presas e y = y ( t ) {\displaystyle y=y(t)} a população de predadores no tempo t {\displaystyle t} , nestas condições é dado o seguinte par de equações
Este sistema tem duas soluções de equilíbrios, P ( 0 , 0 ) {\displaystyle P(0,0)} e Q ( c / d , a / b ) {\displaystyle Q(c/d,a/b)} . Com o uso da Regra da Cadeia pode-se unificar este sistema numa única equação diferencial, obtendo-se
cuja solução geral é dada por
na qual K {\displaystyle K} é a constante de integração e as trajetórias definidas pelo sistema são as curvas de níveis da função f ( x , y ) . {\displaystyle f(x,y).}
Com o objetivo de amenizar certas restrições inerentes ao modelo clássico de Lotka-Volterra, apresenta-se a generalização fracionária do sistema, isto é,
Na qual 0 < α , β {\displaystyle \alpha ,\beta } ≤ 1, a , b , c {\displaystyle a,b,c} e d {\displaystyle d} são constantes positivas e as derivadas fracionárias são tomadas no sentido de Caputo. Assim como no modelo clássico, x {\displaystyle x} e y {\displaystyle y} representam, respectivamente, as populações de presas e predadores, ambas no instante t {\displaystyle t} . O fato das ordens α {\displaystyle \alpha } e β {\displaystyle \beta } poderem ser distintas ameniza a falta de complexidade ambiental no modelo, tornando-o mais realístico, assim como os valores de α {\displaystyle \alpha } e β {\displaystyle \beta } , e das constantes a , b , c {\displaystyle a,b,c} e d {\displaystyle d} serem determinadas experimentalmente.
A dimensão efetiva do sistema, D {\displaystyle D} , é dada pela soma das ordens da equação, isto é, D = α + β . {\displaystyle D=\alpha +\beta .}
A fim de analisar as soluções para o sistema fracionário, assim como no caso clássico, pode-se introduzir as variáveis u ( t ) {\displaystyle u(t)} e v ( t ) {\displaystyle v(t)} , de modo que
Fazendo uso da derivada fracionária no sentido de Caputo, com as devidas substituições de variáveis e simplificações tem-se,
Do qual, o sistema linearizado correspondente, é dado por
Com o propósito de resolver o sistema fracionário linearizado aplica-se a transformada de Laplace nas duas equações, donde tem-se
Em que, F ( s ) ≡ L { u ( t ) } {\displaystyle F(s)\equiv {\mathcal {L}}\{u(t)\}} e G ( s ) ≡ L { v ( t ) } {\displaystyle G(s)\equiv {\mathcal {L}}\{v(t)\}} , e além disso, u 0 = u ( 0 ) {\displaystyle u_{0}=u(0)} e v 0 = v ( 0 ) {\displaystyle v_{0}=v(0)} denotam, respectivamente, as populações iniciais de presa e predador.
A partir deste ponto, ao isolar F ( s ) {\displaystyle F(s)} na segunda equação e substituir sua expressão na primeira, e de modo análogo, isolar G ( s ) {\displaystyle G(s)} na primeira equação e substituir a equação resultante na segunda, chega-se às seguintes transformadas
Assim, tendo em vista que se busca as soluções das respectivas equações do sistema fracionário linearizado, aplica-se nestas equações a transformada de Laplace inversa, donde tem-se as seguintes soluções
nas quais E μ ( x ) {\displaystyle E_{\mu }(x)} e E μ , ν ( x ) {\displaystyle E_{\mu ,\nu }(x)} denotam as funções de Mittag_Leffler [6] de um e dois parâmetros, respectivamente.
Modelos numéricos em geral são capazes de revelar a forma das soluções conforme se variam as ordens das derivadas. As figuras apresentadas representam as soluções do sistema na forma linearizada, sendo consideradas para as constantes os valores a = 2 , b = 8 / 5 , c = 2 {\displaystyle {a=2,b=8/5,c=2}} e d = 2 / 5 {\displaystyle {d=2/5}} . Além disso, as condições iniciais escolhidas são x ( 0 ) = 1000 {\displaystyle {x(0)=1000}} e y ( 0 ) = 180 {\displaystyle {y(0)=180}} .
Para cada uma das possíveis combinações dos parâmetros α {\displaystyle {\alpha }} e β {\displaystyle {\beta }} , que identificam as derivadas fracionárias de x ( t ) {\displaystyle {x(t)}} e y ( t ) {\displaystyle {y(t)}} , tem-se uma curva correspondente, de modo que a partir destas observa-se como α {\displaystyle {\alpha }} e β {\displaystyle {\beta }} influenciam o comportamento das soluções em torno do ponto crítico, Q ( 5 , 5 / 4 ) {\displaystyle {Q(5,5/4)}} , de acordo com as condições estipuladas.
Algumas análises podem feitas a partir dos gráficos, por exemplo, quando α = 1 {\displaystyle {\alpha =1}} e β = 1 {\displaystyle {\beta =1}} tem-se uma elipse centrada em Q {\displaystyle {Q}} , o que é normal devido as derivadas serem de ordem inteira, mas este fato também sugere ser a versão fracionária uma generalização do caso clássico. Além disso, nota-se que conforme se diminui o valor das ordens das derivadas tem se uma convergência para o ponto Q {\displaystyle {Q}} , e isto de modo cada vez mais acentuado.
A dimensão efetiva do sistema, D = α + β {\displaystyle D=\alpha +\beta } , sugere certa influência no comportamento das curvas, uma vez que soluções obtidas a partir de equações com mesmo valor D {\displaystyle D} apresentam traços semelhantes.
Embora o sistema resolvido tenha sido linearizado, a partir das soluções apresentadas percebe-se sob certo aspecto o quanto este modelo denota um caráter mais realístico comparado à versão clássica de Lotka-Volterra, pois conforme a dimensão efetiva do sistema diminui a população das duas espécias tendem a escapar do ciclo da extinção, sendo esta uma característica real das populações devido a outros fatores não considerados.