Pulsar é uma estrela de nêutrons que, em virtude de seu intenso campo magnético (da ordem de 108T), transforma a energia rotacional em energia eletromagnética. A medida que o pulsar gira, seu intenso campo magnético induz um enorme campo elétrico na sua superfície. Este campo elétrico é suficiente para arrancar partículas carregadas da superfície, na sua maioria elétrons, que por sua vez fluem para a magnetosfera onde são acelerados. Estes elétrons acelerados emitem radiação síncrotron em um feixe estreito ao longo das linhas do campo magnético. Se ao girar, o eixo do campo magnético ficar na nossa linha de visada, veremos um pulso de radiação eletromagnética (como a luz de um farol girante).[1][2][3]
História
A existência de estrelas de nêutrons foi primeiramente proposta por Walter Baade e Fritz Zwicky em 1934, quando argumentaram que uma pequena e densa estrela consistindo primariamente de nêutrons resultaria de uma supernova.[4] Em 1967, pouco antes da descoberta dos pulsares, Franco Pacini, astrofísico italiano, sugeriu que uma estrela de nêutrons em rotação com um campo magnético, emitiria radiação e notou que tal energia poderia adentrar os remanescentes de supernova que se encontram ao redor de uma estrela de nêutrons, como a Nebulosa do Caranguejo.[5]
Em julho de 1967, começara a funcionar um grande rádiotelescópio desenvolvido por Antony Hewish em Cambridge, Inglaterra, composto por 2 048 dispositivos de recepção separados, espalhados por uma área de 18 000 m2. Ele era destinado a estudar as cintilações de fontes de rádio localizadas no espaço. Essas cintilações são causadas pelas flutuações na densidade do plasma interplanetário.
Jocelyn Bell Burnell, uma estudante de pós-graduação, que era a responsável pela análise preliminar dos dados, notou um sinal estranho que subitamente desapareceu, vindo a reaparecer três meses depois. O grupo de Hewish concentrou-se nesse estranho sinal, localizando entre as estrelas Vega e Altair, e descobriu que os pulsos de rádio ocorriam numa taxa extremamente regular, a cada 1,33730113 s e com uma duração de 0,05 s.[1][6]
Porém, eles não só demoraram meses em se convencer da autenticidade do sinal, mas quando anunciado, foi seriamente cogitada a hipótese de se tratar de sinais de uma civilização extraterrestre. Na verdade, antes que a palavra pulsar passasse a ser utilizada eles referiam-se ao fenômeno como LGM (sigla em inglês para little green men — homenzinhos verdes).[6][7]
Posteriormente, o grupo descobriu mais três objetos emitindo pulsos de rádio com taxas diferentes e concluíram tratar-se de objetos de origem natural.[1]
Como a fonte emissora parecia se originar de um ponto no espaço, Hewish pensou que ela poderia representar algum tipo de estrela, uma estrela pulsante (do inglês pulsating star), o nome foi então abreviado para pulsar.[6]
Após a descoberta do primeiro pulsar, Thomas Gold sugeriu um modelo de uma estrela de nêutrons em rotação similar ao de Pacini e argumentou que esse modelo poderia explicar a radiação pulsante observada por Bell Burnell e Hewish.[8] A descoberta do pulsar da Nebulosa do Caranguejo em 1968 confirmou esse modelo de representação dos pulsares. O pulsar do caranguejo tem uma pulsação de período igual a 33 milissegundos, pequeno demais para ser consistente com outros modelos propostos para a emissão do pulsar. Além disso, sua localização no centro da Nebulosa do Caranguejo é consistente com a previsão de Baade e Zwicky em 1933.[9]
Em 1974, Antony Hewish e Martin Ryle se tornaram os primeiros astrônomos a ganharem o Prêmio Nobel de Física, com a Academia Real das Ciências da Suécia notando que Hewish teve "papel decisivo na descoberta de pulsares".[10] Certa controvérsia é associada ao fato de Hewish ter ganho o prêmio enquanto Bell Burnell não teve sua participação considerada.[11]
Até 2022, cerca de 3.320 eram conhecidos na Via Láctea.[12]
Nomenclatura
Inicialmente pulsares eram nomeados com as iniciais do observatório responsável pela descoberta seguidas por sua ascensão reta. Conforme mais pulsares foram descobertos, essa convenção tornou-se insuficiente, sendo seguida pelo uso das letras PSR (sigla em inglês para Pulsating Source of Radio - Fonte de Rádio Pulsante) seguidas pela ascensão reta e os graus do arco de declinação. Pulsares muito próximos podem ter letras como apêndices.
A convenção moderna prefixa números antigos com um B, significando que as coordenadas pertencem à época de 1950. Os pulsares descobertos mais recentemente têm um J, que indica que as coordenadas são de 2000, e uma declinação que inclui minutos. Apesar das mudanças, pulsares descobertos antes de 1993 mantém a convenção da letra B ao invés de terem nomes com J. Porém, todos os pulsares possuem um nome com J que fornece coordenadas mais precisas de suas posições no céu.[13]
Formação
Os eventos que levam à formação de um pulsar começam quando o núcleo de uma estrela maciça é comprimido durante uma supernova, formando uma estrela de nêutrons. A estrela de nêutrons mantém grande parte do momento angular original e, uma vez que possui um raio muito menor que a sua progenitora, se forma com uma alta velocidade de rotação. Um feixe de radiação é emitido junto ao eixo magnético do pulsar, que gira conforme a rotação da estrela de nêutrons. O eixo magnético do pulsar determina a direção do feixe eletromagnético e não é necessariamente idêntico ao eixo de rotação da estrela. Isso faz com que o feixe seja visível uma vez para cada rotação da estrela de nêutrons, levando à natureza "pulsante" de sua aparência.
Em pulsares alimentados por rotação, o feixe se origina da energia rotacional da estrela de nêutrons, que gera um campo elétrico a partir do movimento de um forte campo magnético, resultando na aceleração de prótons e elétrons na superfície da estrela e na emissão de um feixe eletromagnético emanando dos polos do campo magnético. Essa rotação diminui ao longo do tempo, à medida que a energia eletromagnética é emitida. Quando o giro de um pulsar diminui suficientemente, o mecanismo de emissão de radiação se desliga. Esse desligamento parece ocorrer aproximadamente após 10 a 100 milhões de anos, o que significa que, de todas as estrelas de nêutrons nascidas nos 13,6 bilhões de anos do universo, cerca de 99% pararam de pulsar.[14]
Magnetares, nos quais o decaimento de um campo magnético extremamente forte fornece o poder eletromagnético.
Apesar de todos os três tipos serem estrelas de nêutrons, seus comportamentos e os processos físicos que os causam são diferentes. Apesar disso, esses tipos estão conectados, com pulsares de Raio X sendo muito provavelmente antigos pulsares de rotação que perderam grande parte de seu poder, visíveis somente devido ao fato de suas respectivas estrelas binárias se expandirem e transferirem matéria para a estrela de nêutrons. Esse processo de acreção pode transferir momento angular suficiente para resumir o movimento de rotação na estrela, com a matéria acrescida diminuindo a força magnética do pulsar por 1 000 a 10 000 vezes do normal. Esse campo magnético enfraquecido é menos eficiente em diminuir a velocidade de rotação dos pulsares, permitindo que eles permaneçam ativos por bilhões de anos e sejam os mais antigos pulsares conhecidos.[14]
Aplicações
A descoberta dos pulsares permitiu aos astrônomos o estudo de um objeto nunca antes observado: a estrela de nêutrons. Esse tipo de objeto é o único lugar no qual o comportamento da matéria em uma densidade nuclear pode ser observado (apesar de não diretamente). Além disso, pulsares com duração de milissegundos permitiram o estudo da relatividade geral em condições de intenso campo gravitacional.
Mapas
Mapas de pulsares foram incluídos nas duas placas Pioneer assim como no Voyager Golden Record. Eles mostram a posição do Sol, relativa a 14 pulsares, que são identificados pelos períodos únicos de seus pulsos eletromagnéticos, de forma que permita o cálculo da nossa posição tanto no tempo como no espaço por potenciais seres extraterrestres.[15] Devido à emissão regular pulsos de ondas de rádio pelos pulsares, suas transmissões não requerem correções diárias. Além disso, a posição dos pulsares poderia criar um sistema de navegação espacial independente ou para ser usado em conjunto com navegação por satélites.[16][17]
Relógios precisos
Geralmente, a regularidade da emissão de um pulsar não se compara à estabilidade de relógios atômicos.[18] Porém, para alguns pulsares de milissegundos, a regularidade da pulsação é ainda mais precisa que a desses relógios.[19] Essa estabilidade permite que pulsares de milissegundos sejam usados para o estabelecimento do tempo de efemérides[20] ou na construção de relógios pulsares.
Sondas do meio interestelar
A radiação dos pulsares passa pelo meio interestelar antes de alcançar a Terra. Elétrons livres existentes no componente ionizado e quente (8 000 K) desse meio e nas regiões H II, afetam a radiação de duas maneiras. As mudanças resultantes na radiação do pulsar são uma importante sonda do meio interestelar em si.[21]
Devido à natureza dispersiva do plasma interestelar, ondas de rádio de baixa frequência trafegam por esse meio mais lentamente que ondas de alta frequência. O atraso resultante na chegada dos pulsos numa faixa de frequências, é diretamente mensurável como a medida de dispersão do pulsar. A medida de dispersão é a densidade de coluna total de elétrons livres entre o observador e o pulsar,
Onde é a distância do pulsar até o observador e é a densidade eletrônica do meio interestelar. A medida da dispersão é usada na construção de modelos da distribuição de elétrons livres na Via Láctea.[22]
Além disso, a turbulência no gás interestelar causa inomogeneidades na densidade no meio interestelar, que faz com que as ondas de rádio dos pulsares sofram espalhamento. A cintilação resultante nas ondas de rádio (o mesmo efeito da cintilação no brilho de uma estrela devido a variações na densidade da atmosfera terrestre), pode ser usada para reconstruir informações sobre as variações em pequena escala do meio interestelar.[23] Devido à alta velocidade (de até centenas de km/h) de muitos pulsares, um único pulsar varre o meio interestelar rapidamente, resultando em mudanças nos padrões de cintilação ao longo de poucos minutos.[24]
Sondas do espaço-tempo
Pulsares orbitando ao longo do espaço-tempo curvado ao redor do Sagittarius A*, o buraco negro supermaciço no centro da Via Láctea, poderiam servir para examinar a gravidade naquele ambiente de intenso campo gravitacional.[25] Os tempos de chegada dos pulsos seriam afetados pelo efeito Doppler, conforme a relatividade geral e especial e pelos caminhos complicados que as ondas de rádio percorreriam no espaço-tempo fortemente curvado ao redor do buraco negro. Para que os efeitos da relatividade geral sejam mensuráveis com a tecnologia atual, pulsares com períodos orbitais menores que 10 anos precisariam ser descobertos,[25] esses pulsares orbitariam a distâncias de cerca de 0,01 pc do buraco negro.
Ver também
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↑ abcStephen A. Gregory; Michael Zeilik (1998). «Capítulo 17: Star Deaths». Introductory Astronomy and Astrophysics (em inglês) 4 ed. [S.l.]: Thomson Learning. ISBN9780030062285 !CS1 manut: Usa parâmetro autores (link)
↑Taylor, J. H.; Cordes, J. M. (Julho de 1993). «Pulsar Distances and the Galactic Distribution of Free Electrons». Astrophysical Journal. doi:10.1086/172870A referência emprega parâmetros obsoletos |coautores= (ajuda)
↑Rickett, Barney J.; Lyne, Andrew G.; Gupta, Yashwant (1 de junho de 1997). «Interstellar Fringes from Pulsar B0834+06». Monthly Notices of the Royal Astronomical Society. Bibcode:1997MNRAS.287..739R. doi:10.1093/mnras/287.4.739A referência emprega parâmetros obsoletos |coautores= (ajuda)