Henrique morreu a 22 de Maio de 1112, tendo sido sepultado na Sé de Braga. Seu filho D. Afonso Henriques sucedeu ao pai e tornou-se o segundo conde de Portucale em 1112.[2] No entanto, o jovem Afonso Henriques rebelou-se contra a sua mãe em 1128, que pretendia manter-se no governo do condado. Afonso passou a intitular-se "Rei dos portugueses" em 1140, independente de Leão, recebendo o reconhecimento oficial de Leão em 1143 através do tratado de Zamora[3] e do Papado em 1179 através da Bula Manifestis probatum.[4]
Biografia
Ambiente familiar
Nascido em 1066, em Dijon, o conde D. Henrique era o filho mais novo de Henrique de Borgonha, filho do duque Roberto I, por sua vez filho do rei Roberto II de França.[1][5] Dois dos seus irmãos mais velhos, Hugo I e Odo I, herdaram o ducado.[5] Apesar de sua mãe, chamada Sibila, aparecer em genealogias tradicionais como filha dos condes de Barcelona, Berengário Raimundo I e sua esposa Gisela de Lluçà, esta filiação não aparece em documentos medievais e Sibila provavelmente foi a filha de Reinaldo I e, portanto, irmã do pai de Raimundo de Borgonha, que de acordo com essas filiações, seria um primo em primeiro grau de Henrique.[6][nt 1]
Uma das suas tias paternas era a rainha Constança, esposa do rei Afonso VI de Leão, e um tio-avô era Hugo, abade de Cluny, irmão de sua avó Hélia de Semur, e uma das personalidades mais poderosas e reverenciadas do seu tempo.[1] Sua família ostentava um grande poder e dominava várias cidades no reino da França, como Chalon, Auxerre, Autun, Nevers, Dijon, Mâcon e Semur.[1] Ele era também um primo distante do PapaCalisto II.
Após a derrota das tropas cristãs na batalha de Zalaca, travada a 23 de outubro de 1086, o rei Afonso VI pediu auxílio aos cristãos do outro lado dos Pirenéus nos primeiros meses do ano seguinte, chamada a que responderam muitos nobres e cavaleiros franceses, entre eles Raimundo de Borgonha, os seus primos-irmãos, o duque Odo e Henrique de Borgonha, assim como Raimundo de Saint-Gilles.[8] Apesar das alegações de que Henrique chegara na primeira expedição em 1087, a sua presença na Península só é atestada a partir de 1096, quando aparece confirmando os forais de Guimarães e de Constantim de Panóias. Em 1 de outubro de 1096 e em 19 janeiro de 1097, o conde Henrique é mencionado em documentos como conde de Tordesilhas.[9]
Três destes nobres franceses contraíram matrimónio com filhas do rei Afonso VI: Raimundo com a infanta Urraca, que sucedeu seu pai no trono leonês; Raimundo de Saint-Gilles com Elvira Afonso;[10] e Henrique de Borgonha com Teresa de Leão,[10] filha nascida da relação extraconjugal de Afonso VI com Ximena Moniz.
Pacto com o seu primo, o conde Raimundo da Borgonha
Entre o primeiro trimestre de 1096 e o final de 1097 o conde Raimundo, ao ver a sua influência reduzida na corte, acordou com o seu primo Henrique de Borgonha, que ainda não tinha sido nomeado governador de Portugal, a partilha do poder, o tesouro real e o apoio mútuo.[11] Através desta aliança, que teve a aprovação do abade Hugo de Cluny, parente de ambos,[nt 2] Raimundo "prometia sob juramento a seu primo Henrique entregar o reino de Toledo e um terço do tesouro real quando Afonso VI morresse". Se ele não pudesse entregar o reino de Toledo, ele daria a Galiza. Henrique, por sua vez, comprometeu-se a ajudar Raimundo a obter "todos os domínios do rei Afonso e dois terços do tesouro".[13]
Conde de Portugal
O rei Afonso VI parece ter tido conhecimento do acordo entre D. Henrique e D. Raimundo e, para contrariar a iniciativa dos seus dois genros, nomeou Henrique conde da região que se estende desde o rio Minho até ao rio Tejo, que até então era governada pelo Conde Raimundo. Este viu o seu poder reduzido apenas ao governo da Galiza.[14][nt 3]
Aliança com Afonso I de Aragão
O rei Afonso I de Aragão, pintura oitocentista.
Por questões políticas e estratégicas, após enviuvar a rainha Urraca de Leão — meia irmã de Teresa de Leão — casou-se com Afonso I de Aragão.
Pouco antes da sua morte, o rei Afonso VI de Leão zangou-se com D. Henrique e este partiu para França a fim de recrutar mercenários que lhe permitissem disputar o trono ao sogro.[16]
Quando D. Afonso VI de Leão faleceu em 1109, sucedeu-lhe a filha D. Urraca, casada com o rei Afonso de Aragão. D. Henrique acordou com o rei de Aragão uma divisão equitativa dos territórios conquistados aos mouros e em conjunto derrotaram as tropas do rei muçulmano de Saragoça.[16] D. Urraca já tinha, no entanto, um filho herdeiro nascido de D. Raimundo, o que deu azo a disputa política na Corte leonesa entre os apoiantes de D. Afonso de Aragão, nomeadamente o conde D. Henrique, e os que defendiam os direitos do filho de D. Raimundo, Afonso VII, nomeadamente os galegos, castelhanos e leoneses, que temiam perder influência na Corte e direitos para os aragoneses.[16]
Na Batalha de Candespina, o experiente D. Henrique e o rei de Aragão derrotaram as tropas leonesas, castelhanas e galegas partidárias de Afonso VII de D. Urraca, a 26 de Outubro de 1110.[16]
Aliança com Leão
Na sequência da batalha de Candespina D. Henrique foi contactado por alguns nobres afectos à causa de D. Afonso VII e D. Urraca e persuadido a juntar-se ao partido leonino, tendo-lhe sido prometido em troca da chefia do exército, a cidade de Zamora, o castelo de Ceia, entre outras benesses.[16] O conde D. Henrique passou então a assinar como conde de Portugal, Zamora e Astorga, tal como se lê num documento assinado em Sahagún em Dezembro de 1111.[16]
Agora associado à rainha, ambos cercam o castelo de Penafiel, ao qual o rei D. Afonso de Aragão se havia recolhido assim que soube da deserção de D. Henrique.[16] Pouco depois do pacto firmado com D. Henrique, D. Urraca preparava já a conciliação com D. Afonso de Aragão e procurava evitar que a cidade de Zamora fosse efectivamente entregue ao conde de Portugal.[16]
Após a sua morte, Teresa governou o condado durante a menoridade do futuro Afonso I de Portugal, que tinha apenas três anos de idade à data da morte do pai.[19]
Legado
O conde D. Henrique foi o líder de um grupo de cavaleiros, monges e clérigos de origem francesa que exerceram uma grande influência na Península Ibérica e impulsionaram muitas reformas e a implementação de instituições transpirenaicas, como os costumes cluniacenses e o rito romano. Essas pessoas ocuparam postos eclesiásticos e políticos relevantes, o que provocou uma forte oposição durante os últimos anos do reinado de Afonso VI.[20]
Genealogia
Ascendência
Ancestrais de Henrique de Borgonha, conde de Portucale
↑"O texto sem data que chegou até nós através de Cluny, consiste numa breve nota remetida ao abade São Hugo por meio de um monge mensageiro chamado Dalmacio Geret, que inclui uma cópia dos juramentos que os dois primos terão prestado mutuamente».[12]
↑O "pacto sucessório" entre os condes Raimundo e Henrique de Borgonha é reproduzido no trabalho de Pierre David.[15]
↑HIC REQVIESCIT D. PETRVS ALPHONSVS, ALCOBATIAE MONACHUS, FRATER D. ALPHONSI; ILLVSTRIS PRIMI REGIS PORTVGALLIAE, CVIVS LABORE, ET INDVSTRIA LOCVS ISTE CISTERCIENSI ORDINI, VIDELICET HVIC LOCO, DE ALCOBATIA FVUIT DATVS IN AERA M.C.LXXXV. QVO ANNO COEPIT REX ALPHONSVS PRIMVS PORTUGALLIAE SANCTARENAM. QVEM D. PETRUS ALPHONSI DE CLAVSTRO ALCOBATIAE VBI PRIVS FVERAT SEPVLTVS, IN DIE S. IOANNIS BAPTISTAE. AERA M.CCC.XXXI. D. DOMINICVS ABBAS TRANSTVLIT AD HVNC LOCVM[29]
↑ abcdefghMiranda, J. C. & Oliveira, A.O. “Da «Historia Compostelana» à «Primeira Crónica Portuguesa»: o discurso historiográfico sobre a formação do Reino de Portugal”, In “In Marsupiis Peregrinorum”. Circulación de Textos e Imágenes Alrededor del Camino de Santiago en la Edad Media: actas del Congreso internacional, Santiago de Compostela, 24-28 marzo 2008/ coord. Esther Corral Díaz, Firenze, Edizioni del Galluzzo, Per la Fondazione Ezio Franceschini, 2010, pp. 295-324. ISBN 978-88-8450-394-7, pp. 3-6.
Almeida, Antonio (1837). «Erros histórico-chronologicos de Fr. Bernardo de Brito na chronica de Cister correctos em 1834». Memorias da Academia R. das Sciencias de Lisboa. XII, parte I. Lisboa: Typografia da Academia R. das Sciencias de Lisboa. OCLC8878678
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Rodrigues Oliveira, Ana (2010). Rainhas medievais de Portugal. Dezassete mulheres, duas dinastias, quatro séculos de História. Lisboa: A esfera dos livros. ISBN978-989-626-261-7
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