Gnose é um substantivo grego feminino que significa "conhecimento" ou "consciência".[7] Ele é frequentemente usado para o conhecimento pessoal em comparação com o conhecimento intelectual (εἴδειν eídein), assim em línguas latinas como o português conhecer comparado com saber, o alemão kennen em vez de wissen, ou o grego moderno γνωρίζω em comparação com ξξω.[8]
O substantivo deriva do verbo gignósko, que significa conhecer. Gnose é conhecimento superior, interno, espiritual, iniciático. No grego clássico e no grego popular, koiné, seu significado é semelhante ao da palavra epistéme. Em filosofia, epistéme significa “conhecimento científico” em oposição a “opinião”, enquanto gnôsis significa conhecimento em oposição a “ignorância”, chamada de ágnoia.[9]
Um termo relacionado é o adjetivo gnostikos, "cognitivo",[10] um adjetivo razoavelmente comum no grego clássico.[11] Os termos não parecem indicar nenhum significado místico, esotérico ou oculto nas obras de Platão, mas, em vez disso, expressam uma espécie de inteligência superior e capacidade análoga ao talento.[12]
Estrangeiro: Desse modo, então, divida toda a ciência em duas artes, chamando uma de prática (praktikos) e a outra puramente intelectual (gnostikos).
Jovem Sócrates: Suponhamos que toda ciência é uma e que essas são suas duas formas.
A diferença e o significado de epignose (em grego: έπἱγνωσις) em contraste com a gnose é contestada. Uma distinção proposta é entre o conhecimento abstrato ou fragmentado (gnosis) e um conhecimento mais claro ou preciso (epignosis). Outras interpretações sugerem que II Pedro está se referindo a uma "epignose de Jesus Cristo", o que J. B. Lightfoot descreveu como um "conhecimento maior e mais completo". A conversão ao cristianismo é vista como evidência do conhecimento mais profundo que protege contra a falsa doutrina.[17]
O gnosticismo se originou no final do século I d.C. em seitas judaicas não rabínicas e entre os primeiros cristãos.[18] Na formação do Cristianismo, vários grupos sectários, rotulados de "gnósticos" por seus oponentes, enfatizaram o conhecimento espiritual (gnosis) da centelha divina interior, sobre a fé (pistis) nos ensinamentos e tradições das várias comunidades de cristãos.[2][5][6][19] O gnosticismo apresenta uma distinção entre o Deus mais elevado e incognoscível e o Demiurgo, "criador" do universo material.[2][5][6][20] Os gnósticos consideravam que a parte mais essencial do processo de salvação era esse conhecimento pessoal, em contraste com a fé como um aspecto na visão de mundo deles junto com a fé na autoridade eclesiástica.[2][5][6][20]
No mandaísmo, o conceito de manda ("conhecimento", "sabedoria", "intelecto") é aproximadamente equivalente ao conceito gnóstico de gnose.[21]
Uso judaico-cristão
Literatura judaica helenística
A palavra grega gnosis (conhecimento) é usada como uma tradução padrão da palavra hebraica "conhecimento" (דעתda'ath) na Septuaginta, assim:
O Senhor dá sabedoria [ħokhma] (sophia), de sua face advém conhecimento [da'ath] (gnosis) e entendimento [tevuna] (synesis)"
―Provérbios 2:6
Fílon também se refere ao "conhecimento" (gnosis) e "sabedoria" (sophia) de Deus.[22]
Literatura patrística
Os Padres da Igreja usavam a palavra gnosis (conhecimento) para significar conhecimento espiritual ou conhecimento específico do divino. Esse uso positivo era para contrastá-lo com a forma como os sectários gnósticos usavam a palavra. Cardiognose ("conhecimento do coração") do cristianismo oriental era relacionada à tradição do starets e na teologia católica romana é a visão de que somente Deus conhece a condição de nosso relacionamento com Deus.[23][24]
Pensamento ortodoxo oriental
Gnose no pensamento cristão ortodoxo (principalmente ortodoxo oriental) é o conhecimento espiritual de um santo (aquele que obteve theosis)[25] ou ser humano misticamente iluminado. Dentro das culturas de proveniência do termo (Bizantina e Helênica), gnose era um conhecimento ou intuição do infinito, divino e incriado em todos e acima de tudo,[26] ao invés de conhecimento estritamente no mundo finito, natural ou material.[27] Gnose é compreensão transcendental bem como entendimento maduro. Indica conhecimento experiencial espiritual direto e intuitivo,[28] místico ao invés do pensamento racional ou raciocinado. A própria gnose é adquirida através da compreensão à qual se pode chegar por meio da experiência interna ou contemplação, como uma epifania interna da intuição, e epifania externa, como a teofania.
Na Filocália, é enfatizado que tal conhecimento não é um conhecimento secreto, mas sim uma forma de conhecimento amadurecida e transcendente derivada da contemplação (theoria resultante da prática do hesicasmo), uma vez que o conhecimento não pode ser verdadeiramente derivado do conhecimento, mas sim, o conhecimento só pode ser derivado de theoria (testemunhar, ver (visão) ou experiência).[28] O conhecimento, portanto, desempenha um papel importante em relação à theosis (deificação/relação pessoal com Deus) e theoria (revelação do divino, visão de Deus).[29] A gnose, como o uso adequado da faculdade espiritual ou noética, desempenha um papel importante na teologia cristã ortodoxa. Sua importância na economia da salvação é discutida periodicamente na Filocália, onde, como conhecimento pessoal direto de Deus (noesis), é distinto do conhecimento epistemológico comum (episteme—isto é, filosofia especulativa).
Conhecimento ou gnose no sufismo se refere ao conhecimento de Si Mesmo e de Deus. O gnóstico é chamado al-arif bi'lah ou "aquele que conhece por Deus". O objetivo do praticante sufi é remover os obstáculos internos ao conhecimento de Deus. Sufismo, entendido como a busca pela Verdade, é buscar a existência separada do Si Mesmo para ser consumido pela Verdade, como afirma o poeta Sufi Mansur al-Hallaj, que foi executado por dizer "Eu sou a Verdade" (ana'l haqq).[30]
↑Cooper and Hutchinson. "Introduction to Politikos." Cooper, John M. & Hutchinson, D. S. (Eds.) (1997). Plato: Complete Works, Hackett Publishing Co., Inc. ISBN0-87220-349-2.
↑Layton, Bentley (1999). «Prolegomena to the Study of Ancient Gnosticism». In: Ferguson. Doctrinal Diversity: Varieties of Early Christianity. Col: Recent Studies in Early Christianity: A Collection of Scholarly Essays. New York and Londres: Garland Publishing, Inc. pp. 106–123. ISBN0-8153-3071-5
↑Buckley, Jorunn Jacobsen (2002). The Mandaeans: ancient texts and modern people. New York: Oxford University Press. ISBN0-19-515385-5. OCLC65198443
↑New Testament studies: Society for New Testament Studies – 1981 "see also the more extensive analysis of gnosis in Philo by Hans Jonas, Gnosis und spatantiker Geist 11/1"
↑Donald K. McKim, Westminster dictionary of theological terms, 1996, p. 39
↑A concise dictionary of theology by Gerald O'Collins, Edward G. Farrugia p. 130 Publisher: T. & T. Clark Publishers (2004) ISBN978-0-567-08354-8
↑“O conhecimento espiritual é o estado de theoria espiritual, quando se vê invisivelmente e se ouve inaudivelmente e se compreende incompreensivelmente a glória de Deus. Precisamente então a compreensão cessa e, o que é mais, ele compreende que não entende. Na visão da Luz incriada o homem também vê anjos e santos e, em geral, ele experimenta a comunhão com os anjos e os santos. Ele então está certo de que a ressurreição existe. Este é o conhecimento espiritual que todos os santos profetas, os apóstolos, mártires, ascetas e todos os santos da Igreja tinha. Os ensinamentos dos santos são uma progênie desse conhecimento espiritual. E, naturalmente, como dissemos antes, o conhecimento espiritual é um fruto da visão de Deus." THE ILLNESS AND CURE OF THE SOUL" Hieroteu Metropolitano de Nafpaktos
↑São Simão, o Novo Teólogo, em Discursos Teológicos e Práticos, 1.1 A Filocália, v. 4: Quando os homens buscam a Deus com seus olhos corporais, eles não O encontram em lugar nenhum, pois Ele é invisível. Mas para aqueles que ponderam no Espírito, Ele está presente em todos os lugares. Ele está em tudo, mas além de tudo
↑Faith And Science In Orthodox Gnosiology And Methodology por George Metallinos "O cientista e professor do conhecimento do Incriado, na Tradição Ortodoxa, é o Geron Starets (o Ancião ou Pai Espiritual), o guia ou “mestre do deserto”. O registro de ambos os tipos de conhecimento pressupõe o conhecimento empírico do fenômeno. O mesmo vale para o campo da ciência, onde apenas o especialista entende as pesquisas de outros cientistas da mesma área. A adoção de conclusões ou achados de um ramo científico por não especialistas (ou seja, aqueles que são incapazes de examinar experimentalmente as pesquisas dos especialistas) é baseada na confiança da credibilidade dos especialistas. Caso contrário, não haveria progresso científico. O mesmo se aplica à ciência da fé. O conhecimento empírico dos Santos, Profetas, Apóstolos, Pais e Mães de todas as idades é adotado e fundamentado na mesma confiança. A tradição patrística e os Concílios da Igreja funcionam sobre esta experiência comprovada. Não há Concílio Ecumênico sem a presença dos glorificados/deificados (theoumenoi), aqueles que vêem o divino (este é o problema dos concílios de hoje!). A doutrina ortodoxa resulta dessa relação." University of Athens - Department of Theology
↑Nasr, Seyyed Hossain (2007). The Garden of Truth: The Vision and Promise of Sufism, Islam's Mystical Tradition. [S.l.]: Harper Collins
Bibliografia
Magris, Aldo (2005). «Gnosticism: Gnosticism from its origins to the Middle Ages (further considerations)». In: Jones, Lindsay. Macmillan Encyclopedia of Religion 2nd ed. New York: Macmillan Inc. pp. 3515–3516. ISBN978-0028657332. OCLC56057973
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