O despotismo esclarecido, também chamado de absolutismo esclarecido, é uma expressão que designa uma forma de governar característica da Europa continental da segunda metade do século XVIII que partilhava, do absolutismo, a exaltação do Estado e do poder do soberano, e, do Iluminismo, os ideais de progresso, reforma e filantropia. Nem todas as propostas do Iluminismo eram plenamente adotadas[1], cabendo ao déspota a escolha e combinação dentre estas diferentes propostas e a sua efetiva implementação. A expressão "despotismo esclarecido" não foi contemporânea aos acontecimentos, tendo sido forjada mais tarde por historiadores.
Contexto
O despotismo esclarecido desenvolveu-se sobretudo no leste europeu (Áustria, Prússia e Rússia), Estados então recentemente constituídos, de economia em geral atrasada e essencialmente agrícola, nos quais a burguesia era muito fraca e, consequentemente, com pouco poder político. Em razão disso, o Estado teve que substituir-se à iniciativa privada, elaborando reformas administrativas e jurídicas, dirigindo a economia e orientando a educação. O despotismo esclarecido contribuiu para acelerar a modernização de alguns países. Do ponto de vista religioso, o despotismo esclarecido não encontrou homogeneidade. Em alguns países caracterizou-se por um espírito secular e, em alguns casos dentre eles, hostil à religião. Em outros, o déspota manteve alianças com a religião.
O argumento para legitimar o poder dos déspotas esclarecidos também não era uniforme. Grande parte deles legitimou o seu poder com base na teoria do contrato social de Thomas Hobbes, na qual se falava sobre a necessidade de um soberano se sobrepor a outras pessoas para assegurar a ordem e evitar a guerra de todos contra todos.[2] Também legitimaram o seu poder com o argumento de que governam por saberem fazê-lo e que, consequentemente, têm que assegurar o progresso de seus povos - de acordo com o novo ethos das Luzes.
Portugal – Marquês de Pombal
Em Portugal, o expoente máximo do despotismo esclarecido esteve no governo do Marquês de Pombal, ministro do rei D. José I. Em particular, criou a Real Mesa Censória (por Alvará de 5 Abril de 1768), com o objetivo de transferir, na totalidade, para o Estado a fiscalização das obras que se pretendessem publicar ou divulgar no Reino, o que até então estava a cargo do Tribunal do Santo Ofício, do Desembargo do Paço e do Ordinário.[4] Estimulou ainda as denúncias como forma de controlo da sociedade. Alguns atos da sua governação foram considerados particularmente cruéis, como o Processo dos Távoras, o Incêndio das cabanas de Monte Gordo, ou o Incêndio da Trafaria, episódio que levou depois Camilo Castelo Branco a denominá-lo "Neroda Trafaria".[5] O iluminismo está presente no incêndio das cabanas de Monte Gordo, já que visava a transferência dos pescadores para Vila Real de Santo António, uma cidade idealizada por si.[6]
Principais experiências de despotismo esclarecido
Em Portugal, com o Marquês de Pombal, ministro do rei D. José I;
Nos Estados italianos, o principal representante foi o Arquiduque Leopoldo de Habsburgo, grão-duque da Toscana e futuro imperador Leopoldo II. No reino de Nápoles destaca-se a ação do ministro Tanucci;
↑Bobbio, Norberto. Thomas Hobbes and the Natural Law Tradition. Chicago: University of Chicago Press, p. 93.
↑Thomaz, Manoel Fernandes. Repertorio geral ou Indice alphabetico das Leis extravagantes. Imprensa real da Univ. Coimbra, 1815. ((item 301. Denúncias «Em segredo dão-se, apresentando o Denunciante um papel sem nele ser nomeado, em que vem escrita a denúncia, e o entrega pessoalmente ao Juiz, que o assina com declaração do dia, mês e ano, em que lhe foi dado; sendo este documento o título, com que o mesmo Denunciante há de requerer por si, ou por interposta pessoa o pagamento da parte, que lhe tocar em tomadia.», pág. 300)
↑«Real Mesa Censória». (Arquivo Nacional da Torre do Tombo). Consultado em 1 de setembro de 2015
↑Castelo Branco, Camilo (1882). Perfil do Marquez de Pombal. [S.l.: s.n.]
↑Silva Lopes, João Baptista da (1841). Corografia: ou, Memoria Econômica, estadistica, e topografica do Reino do Algarve. pág. 382 (...) «levantaram dali os moradores das cabanas e de algumas casas que já havia, sendo isso constrangidos os que desejavam ficar permanecendo, até com a desumanidade de se lançar fogo a essas palhoças ou casas, dos que prontamente não obedeceram. Não foram porém demandar a nova vila, mas sim acolher-se à Higuerita, pequeno porto de Espanha, que foi engrossando (...)». [S.l.: s.n.]
Bibliografia
Corvisier, André. O mundo moderno. Lisboa: Edições Ática, 1976, p. 407-409.
Rémond, René. Introdução à história do nosso tempo: do Antigo Regime aos nossos dias. Lisboa: Gradiva, 1994, p. 63-67.