O Principado de Neuchâtel e Valengin (em francês: Principauté de Neuchâtel et Valengin, em alemão: Fürstentum Neuenburg und Valengin), foi um antigo estado pertencente ao Sacro Império Romano Germânico que corresponde, em termos gerais, ao atual cantão de Neuchâtel, na Suíça.
História
Formação e crises dinásticas
As origens do Principado remontam à época do reiRodolfo III da Borgonha. Em 1011 fala-se da construção de um ”novo castelo“ (em latim: novum castellum, donde surgiria o nome francês[1]) situado no topo de um colina frente ao lago.[2] Ao falecer, sem herdeiros, em 1032, Neuchâtel é mencionado como uma das suas possessões que o imperador Conrado II acaba por incorporar no Sacro Império Romano-Germânico.
Em 1034, o imperador Conrado II confiou o território a Ulrich von Fenis (que se passou a chamar Ulrich de Neuchâtel) convertendo-o no Condado de Neuchâtel. O objectivo era impedir o avanço de Rodolfo III da Borgonha, inimigo do imperador. Em 1046, a doação do condado foi confirmada pelo novo imperador Henrique III, o Negro.
A cidade de Neuchâtel, que fora destruída durante os confrontos de 1033 foi então, reconstruída. O condado começou a desenvolver-se e a expandir-se e, em 1374, todas as terras que formam o atual cantão de Neuchâtel tinham sido incorporadas no condado.
Em 1395, a última representante da família de Ulrich, Isabel de Neuchâtel, faleceu sem herdeiros e, por testamento, nomeou como sucessor Conrado IV de Friburgo. É neste período que tem origem as relações com os estados vizinhos que começavam a integrar a antiga Confederação Suíça: primeiro, com a união pessoal com Friburgo e, depois, com a aliança de 1406 com Berna, um dos mais poderosos cantões da região.
O filho de Conrado IV, João de Friburgo, vem a falecer sem herdeiros em 1457, o que originaria uma crise sucessória. Da disputa entre o príncipe de Orange Luís de Chalon (cunhado de João) e Rodolfo IV de Hachberg-Sausenberg, da Casa de Baden (parente de João), este último impôs-se como novo conde de Neuchâtel. O seu filho, Filipe de Hachberg-Sausenberg, casou-se com Maria de Saboia[3], neta materna de Luís XI de França, aliança que permitiu alcançar um largo período de estabilidade.
Mas, dada a oposição entre os cantões aliados suíços e o reino de França, a Confederação invadiu e ocupou Neuchâtel em 1506 sob a direção de Berna. Luís I veio a morrer em 1516. Em 1529 os confederados retiraram-se de Neuchâtel mantendo uma forte influência no condado durante as décadas seguintes. Joana administrou o Condado até à sua morte, em 1543, ano em que foi sucedida pelo seu neto, Francisco III de Orleães-Longueville, com 8 anos de idade.
A 7 de dezembro de 1584, o senhorio vizinho de Valangin (que fora governado por um ramo da Casa de Neuchâtel) encontrava-se sob um grave conflito sucessório e teve que jurar fidelidade à regente de Neuchâtel, Maria de Bourbon, Condessa de Saint-Pol, sendo, então, incorporado definitivamente no condado.[4]
Mas foi no reinado de Henrique II de Orleães-Longueville que a dinastia se afirmou: em 1601, apenas com um ano de idade, iniciou o governo sob regência da sua mãe e da sua avó até 1617, ano em que atingiu maioridade e passou a governar sózinho. Henrique II manteve grande influência nas políticas continentais, sendo governador das províncias francesas da Picardia e Normandia, figura importante da época da Fronda e foi um dos principais negociadores da Paz de Vestfália, em 1648. Este tratado, garantiu a independência formal do seu estado de Neuchâtel face à Confederação Suíça (com quem mantinha fortes relações), elevando-o de Condado ao grau de Principado Soberano.
A Reforma Protestante, que fora introduzida pelo pregador francês Guillaume Farel em 1530, foi permitida oficialmente durante o reinado de Henrique II; a nova religião dos habitantes de Neuchâtel aproximá-los-ia mais aos vizinhos cantões Suíços e aos territórios alemães que à católica França.
Em 1663, com a morte de Henrique II, os problemas sucessórios continuaram. Os seus sucessores (filhos do seu segundo matrimónio com Ana Genoveva de Bourbon) ainda eram menores, pelo que a mãe atuou como regente. Esta regência foi contestada pela filha mais velha (do primeiro casamento) do duque, Maria Ana de Orleães-Longueville, também conhecida por Maria de Nemours[5], mas o Tribunal dos Três Estados manteve a regência de Ana Genoveva. Sucessivamente, os dois filhos (João Luís e Carlos Paris) governaram como príncipes sob regência da mãe.
Ao morrer, em 1694, João Luís de Orleães-Longueville, deixou por testamento o Principado de Neuchâtel ao seu primo materno Francisco Luís, Príncipe de Conti, sucessão logo contestada pela meia-irmã de João Luís, Maria de Nemours. O Tribunal dos Três Estados decidiu a favor de Francisco Luis mas, dado o forte apoio do povo de Neuchâtel, que temiam a anexação francesa caso o Príncipe de Conti fosse escolhido, Maria de Nemours tornou-se princesa de Neuchâtel, cargo que ocupou até à sua morte, em 1707[6].
Governo prussiano e dominação napoleónica
A morte de Maria gerou um novo vazio dinástico. Para evitar reeditar anteriores problemas, o Conselho de Estado de Neuchâtel decidiu eleger uma nova dinastia. Com o objetivo de afastar a influência francesa, de manter a autonomia e eliminar a pressão sobre os protestantes, a coroa foi entregue ao rei Frederico I da Prússia. Assim, a casa de Hohenzollern, que reinava no distante norte da Alemanha e tinha religião protestante, implementou uma união pessoal com o principado de Neuchâtel. Dada a distância, o rei prussiano nomeou um governador que atuaria em seu nome, mantendo as instituições próprias do principado.
O governo prussiano durou quase um século, período em que floresceu o comércio e a cultura. Mas as Guerras napoleónicas interromperiam este processo e, a 15 de dezembro de 1805, pelo Tratado de Schönbrunn, Napoleão Bonaparte depôs Frederico Guilherme III da Prússia em Neuchâtel, nomeando o seu marechal Louis Alexandre Berthier como novo príncipe. A diferença para outros estados satélites foi que Berthier assumiu-se como príncipe soberano com direitos hereditários e, como se manteve afastado do território, delegou os seus poderes em François-Victor Lesperut. As tropas de Neuchâtel incorporadas no Grande Armée napoleónico ficaram conhecidas por Canários pela côr amarela dos seus uniformes.
Integração na Suíca
Após a derrota de Napoleão, o Congresso de Viena (1814) confirmou a independência da Confederação Suíça (que fora substituída pela república irmã, designada por República Helvética) e a incorporação de Neuchâtel nesta, se bem que mantendo a união pessoal da Prússia com o principado.[7]
Assim, Neuchâtel ficou numa situação especial dentro de Suíça, sendo o único cantão monárquico. As influências republicanas dos cantões vizinhos e a Revolução de Julho em França, originaram um conflito em Neuchâtel entre pró-prussianos e pró-republicanos. Estes últimos, no âmbito das revoluções de 1848, protagonizaram um golpe de Estado e estabeleceram um governo provisório, que alterou a bandeira por uma tricolor verde-branca-vermelha com a cruz suíça no extremo superior direito. Ness mesmo ano, a Suíça estabeleceu uma nova constituição que a converteu numa federação, com Neuchâtel como membro de pleno direito.
O rei Frederico Guilherme IV da Prússia respondeu com uma contra-revolução em 1856 que deu início à clamada Crise de Neuchâtel. O conflito esteve a passos de iniciar uma guerra civil em Neuchâtel que envolveria a Suíça e a Prússia, até que finalmente o rei decidiu renunciar à sua pretensão em 1857.
Soberanos
Casa de Neuchâtel (1034-1395)
1040-1070 : Ulrico I de Neuchâtel
1070-1144 : Mangold I de Neuchâtel, filho do anterior.
1144-1148 : Rodolfo I de Neuchâtel, filho do anterior.
1148-1191 : Ulrico II de Neuchâtel, filho do anterior.
1191-1196 : Rodolfo II de Neuchâtel, filho do anterior.
1191-1225 : Ulrico III de Neuchâtel, irmão do anterior.
1196-1259 : Bertoldo I de Neuchâtel, filho de Rodolfo II.
1259-1263 : Rodolfo III de Neuchâtel, filho do anterior.
1263-1278 : Ulrico IV de Neuchâtel, filho do anterior.
1263-1283 : Henrique de Neuchâtel, filho do anterior.
1283-1288 : Amadeu I de Neuchâtel, irmão do anterior.
1288-1343 : Rodolfo IV de Neuchâtel, filho do anterior.
1343-1373 : Luís I de Neuchâtel, filho do anterior.
1373-1395 : Isabel de Neuchâtel, filha do anterior.
Casa de Friburgo (1395-1457)
1395-1424 : Conrado IV de Friburgo, filho de Egon III de Friburgo e de Varenne de Neuchâtel, filha de Luis I de Neuchâtel
1672-1674 : Interregno – disputa pela regência entre Maria de Nemours (meia-irmã do anterior) e Ana Genoveva de Bourbon (mãe do anterior), resolvida a favor desta última pelo Tribunal dos Três Estados
↑Henry, Philippe - Histoire du canton de Neuchâtel, Tomo 2: Le temps de la monarchie; politique, religion et société de la Réforme, Alphil-Presses universitaires suisses, Neuchâtel, 2011, ISBN 978-2-940235-85-8
↑Ilse, Nicolas - Kreuzberger Impressionen, capítulo Militaria: Die Neffschandeller am Schlesischen Busch, Haude & Spener, Berlim, 1969, ISBN 3-7759-0205-8
↑em França a sua família era designada por Hochberg
Fontes
(em francês) Histoire du Canton de Neuchâtel – obra em 3 tomos:
BUJARD, Jacques ; MOREROD, Jean-Daniel; DE REYNIER Christian - Aux origines médiévales d'un territoire (Tomo 1), ISBN 978-2-88930-002-0
HENRY, Philippe - Le temps de la monarchie. Politique, religion et société de la Réforme à la Révolution de 1848 (Tomo 2),, ISBN 978-2-940235-85-8
BARRELET, Jean-Marc - La création d’une république. De la révolution de 1848 à nos jours (Tomo 3), ISBN 978-2-940235-86-5