Junto a esta ponte monumental se formou e desenvolveu o histórico burgo e vila de Vouga, sede de concelho até meados do século XIX.
A ponte sofreu a derrocada do pilar central em 2011, situação que se mantém na atualidade.
História
Situada sobre o rio Vouga, esta ponte foi construída no século XIII. As mais antigas referências actualmente conhecidas são do 2º quartel desse século: dois legados testamentários em favor da ponte, um não posterior a 1239 e outro datado de 1245
[20].
Tinha já nessa altura pelo menos 10 arcos, dos quais ainda existem e estão visíveis os pilares e as abóbodas até 2 m acima do plano imposta. Pensa-se que teria, no total, 12 arcos, com um comprimento total a aproximar-se dos 160 m
[21].
A ponte fazia parte da chamada estrada coimbrã, via que ligava a cidade do Porto e o noroeste de Portugal à cidade de Coimbra, e que seguia de perto a velha estrada romana.
[22]
No sopé do monte onde existia o castelo ou civitas do Marnel, e bem próximo da ponte, formou-se o burgo de Vouga, que passou a funcionar como sede do mais extenso e antigo município do Baixo Vouga, conhecido como territorio Vauga ou terra de Vouga.
[23]
A importância da ponte para esta região levou a que o seu brasão tivesse como figura central precisamente a representação de uma ponte. [24]
As cheias e o progressivo assoreamento do rio foram obrigando a sucessivas reconstruções da ponte, por vezes com alteamento e/ou alongamento do tabuleiro. A história destas intervenções tem vindo a ser clarificada em estudos recentes.
Sabe-se que sofreu uma intervenção em meados do século XVI
[25],
reinado de Dom João III, mas não se sabe em que consistiu.
Em 1594, um italiano, Giovanni Battista Confalonieri, secretário do patriarca de Jerusalém, passando por ali em peregrinação a Santiago, realçou que a ponte de Vouga era tão longa como a ponte de Sant’Angelo, em Roma (uma das famosas pontes romanas sobre o Tibre).
Em 1708, a ponte já estava tão assoreada que, em tempo de cheias, passava-se o rio em barca. Por volta de 1713, a mando de Dom João V, foi construída uma nova ponte em cima dos pilares e arranques de arcos da ponte medieval
[26].
A nova ponte ficou com 15 arcos
[27].
Por razões ainda desconhecidas, a ponte arruinou-se em finais de 1761, entrando de imediato em funcionamento duas barcas, uma entre as vilas de Vouga e Serém, e outra entre os lugares de Lamas e Vila Verde [28]. Em 1773, sabe-se que os primeiros dois arcos do lado sul, que seriam arcos pequenos, estavam arruinados. Em 1773-1776, a travessia continuava a fazer-se em barca. Em 1776, graças à instalação de passadiços de madeira, a ponte entrou novamente em funcionamento. Finalmente, em 1791, Dona Maria I mandou reconstruir a ponte. Os dois arcos arruinados deram então lugar a três novos arcos, dois dos quais são os maiores da ponte actual. A ponte ficou então com 16 arcos e cerca de 225 m [29].
Em 1930-1932, o tabuleiro foi alargado recorrendo a estruturas de betão armado. Em 1944-1945, o acesso norte foi elevado e o 16º arco terá ficado soterrado.
Apesar das intervenções do século XVIII, subsiste uma boa parte das estruturas da ponte medieval. Além disso, muitos silhares e aduelas da ponte medieval, com as características marcas dos canteiros medievais, estão reutilizados na ponte construída por Dom João V
[30]. A ponte é actualmente o principal repositório de marcas dos canteiros medievais em todo o distrito de Aveiro.
Com o desaparecimento de outras pontes históricas monumentais tão importantes como a ponte romana de Sacavém, sobre o rio Trancão, e a ponte de Coimbra, sobre o Mondego, a ponte de Vouga é hoje a principal ponte histórica existente no traçado da velha «estrada principal do reino». É também a principal ponte histórica na bacia do Vouga e no distrito de Aveiro. No entanto, e ao contrário do que por vezes aparece escrito, esta ponte ainda não foi objecto de classificação. [31]
Nome
Este monumento é hoje popularmente conhecido como "ponte velha do Vouga" ou "ponte do Vouga". Em trabalhos de investigação especificamente dedicados ao monumento, quer antigos [32], quer recentes [33], tem prevalecido a designação historicamente documentada desde o século XIII, a saber, "ponte de Vouga".
De facto, a ponte era identificada pela vila junto à qual estava localizada (Vouga) e não pelo rio homónimo, no qual aliás existiram/existem outras pontes desde longa data. Daí dizer-se "de Vouga" (vila) e não "do Vouga" (rio). Já no século XVI, falando do povoamento romano na sua famosa Chorographia, Gaspar Barreiros frisava: «o lugar de Vacca q nos auemos sera que ora chamã Ponte de Vouga, .s. Põte de Vacca, nam por causa do rio senam por causa do nome do lugar».[34]. Dois séculos mais tarde, em 1758, na memória paroquial de São Pedro de Segadães, encontra-se uma referência semelhante: "ponte de pedra de cantaria junto a villa de Vouga, da qual toma o nome" [35]. Na documentação do antigo concelho de Vouga, a designação "ponte de Vouga" era também usada de forma sistemática.
Cronologia de um abandono
Na sequência da construção da nova ponte (EN1/IC2) a jusante da ponte antiga, esta ficou sem manutenção e o seu estado deteriorou-se rapidamente:
1984 - Inauguração da ponte nova.
1996 - Ponte velha de Vouga passou para a responsabilidade da Câmara Municipal de Águeda.
2001 - Queda da ponte de Entre-os-Rios assusta a Câmara Municipal de Águeda, que decide ordenar uma inspecção à ponte velha de Vouga.
2002, 8 de Março - Segundo inspecção por empresa credenciada, o estado de conservação dos elementos da ponte era variado: 1 - muito bom (guarda corpos, passeios), 2 - bom (muros de ala, taludes, encontros), 3 - razoável (revestimento da via), 4 - mau (apoios intermédios, tabuleiro), 5 - muito mau (cornijas). Globalmente, o estado de conservação era de grau 4 - mau, significando risco elevado de a ponte deixar de cumprir a sua função. O estado de manutenção era também mau.
2008-2009 - Ponte tem um pilar muito degradado e um abatimento no tabuleiro. Alcides de Jesus, Presidente da Junta de Lamas de Vouga, lança vários alertas sobre o estado da ponte.
2010, 8 de Setembro - Por ordem da Câmara Municipal de Águeda, foi feita nova inspecção à ponte, segundo a qual o estado de conservação dos seus elementos era variado: 2 - bom (taludes, encontros, passeios), 3 - razoável (muros, revestimento da via, guarda corpos, drenagem), 4 - mau (tabuleiro), 5 - muito mau (apoios intermédios). Globalmente, o estado de conservação estava em grau de gravidade 5 - muito mau, ou seja, risco muito elevado de a ponte deixar de cumprir a sua função. O estado de manutenção era mau. O custo da reparação geral da ponte estava estimado em 350 000 EUR.
2011, 2 de Maio - Dado agravamento do estado da ponte, ela foi encerrada ao trânsito automóvel, continuando a ter trânsito de peões, bicicletas e motociclos.
2011, Setembro - Alcides de Jesus volta a chamar a atenção para o estado da ponte em Assembleia Municipal.
2011, 12 de Novembro - Por falta de manutenção, o 7º pilar e os dois arcos centrais da ponte cederam à força das águas [36].
2011, 13 de Novembro - A partir desta data, domingo, menos de 24h após a queda do pilar, a narrativa oficial passou a ser de que a reabilitação da ponte custuria «vários milhões de euros» ou «mais de dois milhões de euros».
2011, 14 de Novembro - CMA informa que vai realizar estudo com vista à demolição da ponte.
2011, Novembro-Dezembro - Levanta-se um coro de vozes em defesa da ponte [37][38][39][40][41].
2011, 23 de Dezembro - Assembleia de Freguesia de Macinhata do Vouga aprova por unanimidade moção em defesa da reconstrução da ponte «que muito orgulhava o nosso concelho», «por ser um legado dos nossos avós, que devemos preservar por todos os meios ao nosso alcance».
2012 - Foram removidos os escombros do pilar arruinado e salvaguardada a inscrição alusiva à obra de Dom João V.
2012, Novembro - Na Assembleia Municipal, o deputado José Manuel Gomes de Oliveira, questiona: "Se fecharam [a ponte] é porque ela não estava em condições. Porque é que não intervieram imediatamente?" e conclui de forma lapidar: "Uma pequena obra e não deixavam cair a ponte, mas deixaram!"
2013-2023 - Sucessivas tomadas de posição em defesa da ponte, quer nos órgãos autárquicos, quer na comunicação social, sem resultado.
2020, 10 de Outubro - CDU de Águeda lança abaixo-assinado em defesa da reabilitação da ponte.
2022, 21 de Janeiro - Luís Seabra Lopes apresenta pedido de classificação da ponte, sugerindo a categoria de Monumento Nacional.
2023, 9 de Janeiro - Grupo parlamentar do Partido CHEGA apresenta na Assembleia da República "Projecto-Resolução pela classificação como imóvel de interesse nacional e reabilitação da antiga Ponte do Vouga".
2023, 23 de Janeiro - Despacho da Direcção Geral do Património Cultural, no qual é dito que "enquanto não for efetuada uma intervenção de recuperação, baseada num projecto de requalificação, pensado e estruturado, não será possível proceder à abertura de um procedimento de eventual classificação do imóvel com uma categoria de valor nacional [...]. À semelhança de outros casos [...], a sua classificação como valor nacional ficará dependente de uma intervenção futura." Entretanto, "[dada] a sua importância a nível histórico-arquitectónico, ao que se acresce o seu simbolismo e valor imaterial, e ainda o facto de ser inteiramente viável a sua valorização patrimonial, parece-nos que poderá levar desde já à sua eventual classificação como MIM [=Monumento de Interesse Municipal], caso a Câmara Municipal de Águeda assim o considere. Tal facilitará candidaturas a possíveis financiamentos que permitam ao Município efectuar as intervenções mais necessárias e prioritárias."
2023, 26 de Setembro - "Projecto-Resolução pela classificação como imóvel de interesse nacional e reabilitação da antiga Ponte do Vouga" foi analisado na Comissão Parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, tendo recebido bom acolhimento por parte dos principais partidos.
2023, 29 de Setembro - O mesmo Projecto-Resolução foi votado em reunião plenária da Assembleia da República, tendo sido chumbado pela maioria absoluta do PS, apesar dos votos favoráveis do PSD, CHEGA, IL, BE e PAN e das abstenções do PCP e Livre.
2023, 1 de Novembro - Grupos municipais do PS e CDS (Assembleia Municipal) distanciam-se da posição da Câmara.[42]
2024, 6 de Novembro - em resposta a pergunta de um deputado na Assembleia da República, a Secretária de Estado da Cultura, Lurdes Craveiro, informa que a classificação da ponte de Vouga está novamente a ser ponderada.[43]
Bibliografia
BARREIROS, Gaspar (1561) Chorographia de alguns lugares que stam em hum caminho que fez Gaspar Barreiros ó anno de MDXXXXVJ começãdo na cidade de Badajoz em Castella te á de Milam em Italia, João Alvares (impr.), Coimbra.
↑Sousa Baptista, 1947; Sousa Baptista, 1958; Nogueira Gonçalves, 1959. Não tem fundamento a ideia, muito difundida, de que a obra da ponte tenha sido ordenada em 1529.