Idácio de Chaves (Xinzo de Limia, c. 395 – depois de 468), também conhecido como Idácio de Límica, por ser natural da civitasromana de Forum Limicorum (actual Xinzo de Limia, na provínciagalega de Ourense), foi um bispo e cronista galaico-romano do século V.
Deteve considerável influência política; tal como todos os bispos do seu tempo, era ele o verdadeiro senhor da cidade cabeça de diocese – não a podia abandonar, ao contrário dos senhores leigos, e era muitas vezes o seu defensor contra os invasores bárbaros.
Idácio assistiu aos últimos estertores do poder romano, cada vez mais nominal, sobre a Galécia, e ao triunfo dos Suevos pagãos na região, na qual se haviam estabelecido a partir de 411. Desde então que havia constantes fricções entre os Bárbaros e os Hispano-romanos autóctones.
Outra sua preocupação foi extirpar as heresias, não apenas na sua diocese, mas em todo o solo hispânico; sabe-se que estabeleceu contactos frequentes com outros bispos importantes, como Turíbio de Astorga e Antonino de Mérida. Juntamente com Toríbio, solicitou ao Papa Leão I (440-461) ajuda e conselho para lidar com a heresia.
Embora Idácio caracterize os hereges da Hispânia como maniqueus, crê-se que na realidade ele se quisesse referir aos priscilianistas, seguidores do bispo e asceta hispânico Prisciliano, executado cerca de 385 por ordem do imperador Magno Máximo (383-388); a sua doutrina havia sido considerada herética em vários concílios regionais, e os seus seguidores ferozmente perseguidos.
Pouco mais conhecemos do resto da vida de Idácio; sabe-se no entanto que foi sequestrado e encarcerado por uns meses em 460 pelos seus inimigos, o que sugere que de facto teve importante papel na política interna do reino suevo.
Obra
Idácio destacou-se também pela sua obra escrita. Tal como muitos outros na sua época, e à maneira de Jerónimo e de Eusébio de Cesareia, começou a escrever uma Crónica (chamada também de Cronicão), de grande interesse historiográfico (trata-se de resto a mais importante fonte para conhecer o século Vpeninsular e reconstruir o curso dos acontecimentos desse período obscuro); o género historiográfico estava então em grande voga entre os escritores cristãos, procurando-se adaptar os acontecimentos ocorridos à história bíblica e à Providência Divina.
Idácio inicia a sua Crónica com um prólogo dedicado a São Jerónimo e no qual descreve a dívida que tem para com ele; passa então à descrição dos vários acontecimentos ocorridos na Galecia entre o ano de 379 e o de 468 (julga-se que Idácio não terá tido oportunidade de terminar o seu trabalho, e por conseguinte, deve ter morrido nesse ano ou pouco depois, ao que parece na sua cidade natal de Límica). Na primeira parte (anos de 379 a 427) as suas informações derivam dos testemunhos de outros sujeitos; de 427 em diante, narra os eventos como sua testemunha directa. Fala sobretudo do reino suevo no qual vivia, na heresia de Prisciliano que então varria a Península, assim como a invasão e repartição da Península entre os Bárbaros (Alanos, Suevos, Vândalos e Visigodos).
Idácio teve acesso a várias fontes históricas e cronográficas (embora não possamos precisar exactamente quantas), e chegou a usar quatro sistemas cronológicos paralelos – o que causa, sobretudo na parte final da sua Crónica, grandes dúvidas quanto à datação correcta dos acontecimentos narrados. A narração dos acontecimentos tende a ser bastante sucinta para os primeiros anos, mas, à medida que vai avançando, oferece um número cada vez maior e mais completo de informações – não se trata de uma crónica típica, antes de uma cronografia orgânica permanentemente actualizada até à sua morte (sobretudo nos anos posteriores a 427, em que narra os factos per se).
Ao longo da Crónica, a principal preocupação de Idácio é demonstrar a dissolução da sociedade, e em particular a desagregação do próprio Império Romano na Hispânia. Pinta um quadro negro da vida do século V, que bem poderia advir da sua crença iminente no fim do Mundo, com a segunda vinda de Cristo – tal como relatado numa carta apócrifa do apóstoloTomé que Idácio terá lido, e onde se dizia que o mundo acabaria em Maio de 482. Se Idácio realmente acreditava que estava a escrever a sua Crónica pouco antes do fim do Mundo, então não é de estranhar o pessimismo demonstrado na sua escrita.
Isso tê-lo-á levado, sem dúvida, a descrever de modo muito obscuro certos acontecimentos que constituem o verdadeiro clímax da sua narração – como por exemplo, o saque da capital sueva, Braga, no ano de 456, pelo rei visigodo Teodorico II (actuando este ao serviço do imperador romanoÁvito).