O dióxido de enxofre, também conhecido como anidrido sulfuroso, é um composto químico constituído por dois átomos de oxigênio e um de enxofre; a sua fórmula química é SO2. É um gás denso, incolor, não inflamável e altamente tóxico e a sua inalação pode ser fortemente irritante. Esse gás é o responsável pelo cheiro de fósforos queimados.
Dióxido de enxofre é encontrado na Terra em concentrações muito pequenas e na atmosfera em concentrações de aproximadamente 1 ppm (parte por milhão).[5][6]
Em outros planetas, dióxido de enxofre pode ser encontrado em diversas concentrações, o mais significante sendo na atmosfera de Vênus, onde é o terceiro gás atmosférico mais significante em uma concentração de 150 ppm. Lá, ele se condensa para formar nuvens, e é um componente chave das reações químicas na atmosfera do planeta, também contribuindo para o aquecimento global.[7] Foi sugerido como componente chave no aquecimento de Marte em seu período primordial, com concentrações estimadas de até 100 ppm[8] na baixa atmosfera do planeta, porém só existe em quantidades à nível de traço. Em ambos Vênus e Marte, assim como na Terra, sua fonte primária é presumida como vulcânica. A atmosfera de Io, um satélite natural de Júpiter, é 90% dióxido de enxofre[9] e também se supõe que esteja à nível de traço na atmosfera de Júpiter.
É supostamente encontrado em abundância nas luas de Galileu em forma de gelo, como gelo sublimável ou geada na atmosfera "em fuga" de Io[10] e na crosta e manto de Europa, Ganimedes e Calisto, possivelmente também em forma líquida e reagindo rapidamente com água.[11]
Produção
O dióxido de enxofre é produzido principalmente para manufatura de ácido sulfúrico (ver processo de contato). A maior parte é produzida pela combustão do enxofre elemental; em menor escala é obtido pela ustulação da pirita e outros minérios sulfetados.[12]
Dióxido de enxofre é o produto da combustão do enxofre ou de materiais que contenham enxofre em sua composição:
S + O2 → SO2, ΔH = −297 kJ/mol
Para auxiliar na combustão, enxofre liquefeito (140–150 °C) é pulverizado através de um bocal de atomização para gerar gotículas de enxofre com uma grande área de superfície. A reação é exotérmica, e a combustão produz temperaturas de 1000–1600 °C. A quantidade considerável de calor gerado é recuperada pela geração de vapor, que pode posteriormente ser convertida em eletricidade.[12]
A ustulação de minérios sulfetados como pirita, esfalerita e cinábrio (sulfeto de mercúrio) também liberam SO2:[13]
4 FeS2 + 11 O2 → 2 Fe2O3 + 8 SO2
2 ZnS + 3 O2 → 2 ZnO + 2 SO2
HgS + O2 → Hg + SO2
4 FeS + 7O2 → 2 Fe2O3 + 4 SO2
Uma combinação dessas reações é responsável pela maior fonte de dióxido de enxofre, as erupções vulcânicas. Esses eventos podem liberar milhões de toneladas de SO2.
Dióxido de enxofre é o agente oxidante no processo Claus, que é utilizado em larga escala em refinarias de petróleo. Aqui, o dióxido de enxofre é reduzido pelo sulfeto de hidrogênio para produzir enxofre elemental:
SO2 + 2 H2S → 3 S + 2 H2O
A oxidação sequencial de dióxido de enxofre seguida pela hidratação é usada na produção de ácido sulfúrico.
2 SO2 + 2 H2O + O2 → 2 H2SO4
Reações de laboratório
O dióxido de enxofre é um dos poucos gases ácidos comuns que também são redutores. Ele torna rosa o papel tornassol úmido (devido à acidez), e então branco (devido à sua ação alvejante). Pode ser identificado pelo borbulhamento através de uma solução de dicromato, mudando a cor da solução de laranja para verde (Cr3+(aq)). Também pode reduzir íons férricos para ferrosos.[14]
O dióxido de enxofre pode se ligar a íons metálicos como ligante para formar complexos de metal-dióxido de enxofre, normalmente onde o metal de transição está em estado de oxidação 0 ou +1. Vários modos de ligação (geometrias) são observados, mas na maioria dos casos, o ligante é monodentado, ligado ao metal através do enxofre, que pode ser planar ou piramidal η1.[15] Como um η1-SO2 (S-ligante planar) o dióxido de enxofre ligante funciona como uma base de Lewis usando o par de elétrons não-ligantes do S. O SO2 funciona como um ácido de Lewis no modo de ligação η1-SO2 (S-ligante piramidal) com metais e em adutos 1:1 com bases de Lewis como a dimetilacetamida e trimetilamina. Quando ligado a bases de Lewis, os parâmetros ácidos do SO2 são EA = 0,51 e EA = 1,56.
Aplicações
O uso mais abrangente e predominante do dióxido de enxofre é para produção de ácido sulfúrico, que possui numerosas aplicações como produto químico.[12]
Precursor do ácido sulfúrico
O dióxido de enxofre é um intermediário na produção de ácido sulfúrico, sendo convertido em trióxido de enxofre, e então em oleum (ácido dissulfúrico), que é transformado em ácido sulfúrico. Dióxido de enxofre para esse fim é produzido quando enxofre se combina com oxigênio. O método para converter dióxido de enxofre em ácido sulfúrico é chamado de processo de contato. Milhões de toneladas são produzidos anualmente com esse propósito.
Conservante
O dióxido de enxofre é ainda utilizado como desinfetante, antisséptico e antibacteriano, como agente branqueador e conservador de produtos alimentares, nomeadamente frutos secos, e ainda na produção de bebidas alcoólicas e particularmente no fabrico do vinho. No vinho, o dióxido de enxofre aparece na sua forma livre hidratada H2SO3 ou ácido sulfuroso. O dióxido de enxofre é utilizado na vinificação pois inibe ou interrompe o desenvolvimento das leveduras e bactérias, detendo assim a fermentação alcoólica no momento desejado, ao mesmo tempo que assegura a esterilização do vinho. Acresce que o dióxido de enxofre “seleciona” as leveduras necessárias à vinificação, pois estas são mais resistentes que outras presentes no processo mas não desejadas. Nos rótulo das garrafas de vinho normalmente vem especificado que o produto tem INS 220 ou Conservante PV, ou seja, o próprio SO2. Muitas pessoas portadoras de enxaqueca relatam o agravamento da crise após tomar vinhos, que pode ser causada por estes conservantes, entretanto, não há conclusões definitivas sobre esse elemento ser o causador das dores de cabeça.
Como agente redutor
O dióxido de enxofre também é um bom redutor. Na presença de água, o SO2 é capaz de descolorir substâncias. Mais especificamente, ele é um alvejante útil para papel e materiais delicados como roupas. Porém, esse efeito alvejante normalmente não dura muito tempo, já que o oxigênio na atmosfera oxida novamente os corantes reduzidos, fazendo com que recuperem a coloração.
Para o tratamento de esgoto municipal, dióxido de enxofre é utilizado para tratar água residual clorada antes da liberação para consumo. O SO2 reduz cloro livre e combinado para cloreto.[16]
O dióxido de enxofre é bastante solúvel em água, e pelas análises de espectroscopia de infravermelho e espectroscopia Raman; o hipotético ácido sulfuroso, H2SO3, não está presente em nenhuma concentração. Entretanto, essas soluções mostram espectros do íon sulfito de hidrogênio, HSO3−, pela reação com água, e ele é de fato o agente redutor presente:
SO2 + H2O ⇌ HSO3− + H+
Impacto ambiental
Solubilidade de alguns gases em água (Pgás = 1 atm)[17]
Gás
Solubilidade em água (g/L)
10 oC
20 oC
25 oC
SO2
153,9
106,6
94,1
CO2
1,69
1,45
O3
0,802
0,610
NO
0,0770
0,0630
0,0577
O2
0,0545
0,0443
0,0406
O dióxido de enxofre apresenta uma melhor solubilidade em água, se comparado com outros gases presentes na atmosfera, o que resulta em um enriquecimento de S (IV) na água da chuva, nuvens e neblina.[17]
É, juntamente com o dióxido de nitrogênio (NO2), um dos principais causadores da chuva ácida, pois, associado à água presente na atmosfera, forma ácido sulfuroso. Por ser prejudicial à saúde e ao meio ambiente limita-se o teor de enxofre presente nos combustíveis de modo a diminuir a emissão desse gás.
↑Shriver, Atkins. Inorganic Chemistry, Fifth Edition. W. H. Freeman and Company; New York, 2010; p. 414.
↑Government of Canada, Public Services and Procurement Canada. «Information archivée dans le Web»(PDF). publications.gc.ca. Consultado em 3 de junho de 2021
↑Greenwood, Norman N.; Earnshaw, Alan (1997). Chemistry of the Elements (2nd ed.). Butterworth-Heinemann. ISBN 978-0-08-037941-8.