Construção de terra

Casas de barro em Kandahar, no Afeganistão.

Uma construção de terra é um edifício, ou outra estrutura, feita em sua maior parte com solo. Dado que o solo é um material amplamente disponível, ele tem sido usado em construções desde tempos pré-históricos. Ele pode ser combinado com outros materiais, comprimido, ou assado, com a finalidade de aumentar a resistência. O solo ainda é um material econômico para muitas aplicações, e pode ter baixo impacto ambiental tanto durante, quanto após a construção ser finalizada.

Tipos de materiais

Casas tradicionais circulares de lama, formando uma área de família perto de Tamale, Gana.

A terra normalmente requer algum tipo de processamento, para que possa ser usada em construções. Ela pode ser combinada com água para fazer lama, palha pode ser adicionada, alguma fôrma de material estabilizador como cal ou cimento pode ser usado para endurecê-la, e a terra pode ser compactada para aumentar a resistência.[1]

Lama

Lama enfileirada é uma das mais antigas abordagens para construção de paredes. Lama úmida é preparada à mão, para fazer a base da parede, e deixada secar. Quando seca, mais lama é adicionada, formando sucessivas fileiras até a parede estar completa.

Lama empoçada, por outro lado, é feita com uma fôrma à mão, de lama, na qual é derramada lama muito mais úmida, e deixada secar.[2] No irã, paredes de lama empoçada são chamadas de construção chine. Cada fileira tem de 4,5cm a 6cm de espessura, com igual medida de altura. Normalmente, a técnica é utilizada para muros de jardim, mas não para a construção de casas, presumivelmente por causa da preocupação com a resistência destas paredes.[3] Uma desvantagem desta abordagem é que leva-se muito mais tempo na espera da secagem de cada fileira.[4]

Outra técnica, usada em áreas onde a madeira é abundante, é a construção de uma moldura de madeira para a casa, e o preenchimento desta moldura com lama, principalmente para fornecer isolamento. Em algumas partes da Inglaterra, uma técnica semelhante foi utilizado com o cob.[2]

Cob

Parede de cob, na Inglaterra. Esta tem centenas de anos de idade e está protegida contra água.

Cob, por vezes referido como "adobe monolítico",[5] é um material de construção natural feito a partir de solo que inclui argila, areia ou pedras pequenas, e um material orgânico, como palha. Paredes de cob são normalmente construídas em fileiras, não têm juntas de argamassa e precisam de 30% ou mais argila na composição do solo. Cob pode ser usado como preenchimento nos edifícios de quadros de madeira, mas é frequentemente usado para paredes que suportam peso, e podem suportar até 2 andares. Paredes de cob devem ter pelo menos 4cm de espessura, e a proporção entre largura e altura não deve ser maior que 1:10.[5] Geralmente, cob estará rebocado por dentro e por fora por uma mistura de cal, solo, e areia. Cob é à prova de fogo, e sua massa térmica ajuda a estabilizar temperaturas internas.[5] Testes demonstraram que cob tem alguma resistência à atividade sísmica, no entanto, os códigos de construção no mundo desenvolvido podem não reconhecer cob como um material aprovado.[6]

Relva

Tijolos de relva.

Tijolos de relva, chamados terrone em espanhol, podem ser usados para construir paredes resistentes e duráveis. A relva é cortada a partir de solo que tenha um tapete denso de raizes de grama, podendo ser encontrados nas terras mais próximas do fundo de rios. O solo cortado é deixado na margem para secar, antes de ser usado na construção.[4]

Colonos europeus nas pradarias Norte-Americanas descobriram que a relva menos propensa a se deteriorar devido a congelamento ou chuva advém de charcos secos.[7] Relva foi, em certa época, extensivamente usada para as paredes de casas na Irlanda, Escócia e Islândia, onde algumas casas de relva ainda podem ser encontradas. Uma casa de relva pode durar 50 anos ou mais, se for bem mantida em um clima frio.[8] Os Islandeses descobriram que a melhor qualidade de relva é o Strengur, os 5cm superiores da relva de grama.[9]

Terra estabilizada

A argila é geralmente dura e forte quando seca, mas torna-se bem macia quando absorve água. A argila seca ajuda a segurar uma parede de terra, mas se a parede for diretamente exposta à chuva, ou a água vazando a partir do telhado, pode tornar-se saturada e colapsar.[10] Para evitar isto, a terra pode ser "estabilizada"; a prática de estabilização da terra através da adição de cal queimado é secular.[11] Cimento Portland ou betume também podem ser adicionados à terra destinada para construções, adicionando resistência desta forma, apesar de que a terra estabilizada não é tão forte como argila assada ou concreto.[11] Misturas de cimento + cal, ou pozzolana + cal, podem também ser utilizadas para a estabilização.[12]

De preferência, o teor de areia do solo será entre 65% ~ 75%. Solos com baixo teor de argila, ou com não mais que 15% de barro não-expansivo, são adequados para fazer terra estabilizada.[13] O percentual de argila pode ser reduzido pela adição de areia, se disponível.[14] Se houver mais de 15% de argila, pode ser necessário mais de 10% de cimento para estabilizar o solo, o que aumenta o custo.[13] Se a terra contiver pouca argila, e 10% ou mais de cimento, ela é de fato concreto. Cimento não é particularmente amigável com o meio ambiente, dado que seu processo de fabricação gera grandes quantias de dióxido de carbono.[15] Terra estabilizada de baixa densidade será porosa e fraca, devendo portanto, ser compactada por uma máquina que faça blocos, ou já na parede, usando a técnica de taipá de pilão.[12]

Taipa de pilão

Pátio do Colégio dos Jesuítas, em São Paulo.

Taipa de pilão é uma técnica para a construção de paredes utilizando matérias-primas cruas, como terra, giz, cal ou cascalho. Uma parede de taipa de pilão é construída colocando solo úmido em uma fôrma temporária. O solo é compactado manual ou mecanicamente e, em seguida, a fôrma é removida.[16]

Taipa de pilão é feita geralmente sem muita água, e portanto, não precisa de muito tempo para secar conforme o edifício cresça. É suscetível à umidade, e por isso deve ser colocado sobre uma base que pare a umidade ascendente, e deve ter telhas ou alguma outra cobertura que impeça que água de cima infiltre-se. Pode ser necessária também alguma proteção através de algum tipo de gesso, tinta, ou casca.[15]

Na China, paredes de taipa de pilão foram construídas pelo povo Longshan entre 2600-1900 a.c., durante o período em que as cidades apareceram pela primeira vez na região. Paredes grossas íngremes, feitas de taipa de pilão, tornaram-se uma característica de monastérios budistas tradicionais, através dos Himalaias, e tornaram-se bem comuns em áreas do norte da Índia, como Sikkim.[17] A técnica se espalhou para o Oriente Médio, depois para o Norte da África, onde a cidade de Cartago foi construída com esta técnica. A partir daí, a tecnologia foi levada para a Europa pelos Romanos.[18] Estruturas de taipa de pilão podem ter longa durabilidade. A maior parte da Grande Muralha da China foi feita com esta técnica, bem como foi Alhambra, no Reino Nacérida de Granada (atual Espanha). No Norte da Europa, estão construções de taipa de pilão de até sete andares de altura, e dois séculos de idade.[15]

No Brasil, os primeiros registros de taipa de pilão foram na época do Brasil Colônia, onde foi introduzida pelos portugueses e contou com a contribuição dos escravos africanos. Muitos autores indicam como a obra mais duradoura a casa forte de taipa de pilão construída por Caramuru na Bahia, em 1540. Aplicada também em construções religiosas, em 1554, foi construído o Colégio dos Jesuítas da Companhia de Jesus, o que ocasionou a construção das primeiras casas de taipa ao seu redor e depois a origem do povoado de São Paulo de Piratininga, hoje a atual cidade de São Paulo.[19][20]

Essa técnica foi introduzida no território brasileiro devido a sua boa resistência ao tempo e por ser menos trabalhosa do que a alvenaria de pedra. Ela possibilitou construções coloniais em regiões que tinham dificuldade em obtenção de pedras. Na região paulista a taipa de pilão foi muito utilizada no Planalto de Piratininga e no Caminhos dos Bandeirantes até Minas Gerais, Mato Grosso, Goiás, Paraná e Rio de Janeiro.[21]

Concreto

Visão interna do Coliseu. Edificação de concreto romano.

Os romanos fizeram concreto durável e resistente o bastante para paredes que suportassem peso.[22] O concreto romano contém entulho de tijolos quebrados e pedras misturados em argamassa. A argamassa incluía cal e pozzolana, um material de origem vulcânica que contribuía significativamente para sua força.[23] Estruturas de concreto romano, como o Coliseu, completado em 80 BCE, ainda estão de pé.[24] Sua longevidade pode ser explicada pelo fato de que os construtores usaram uma mistura relativamente seca de argamassa e agregados, e compactaram-na para eliminar bolsões de ar.[25] Apesar de derivados da terra, estruturas de concreto normalmente não são consideradas estruturas de terra, para permitir diferenciar.[26]

Galeria de imagens

Ver também

Referências

  1. Watson 1993, p. 290.
  2. a b Cornerstones Community Partnerships 2006, p. 72.
  3. McHenry 1984, p. 110.
  4. a b McHenry 1984, p. 4.
  5. a b c ICAEN 2004, p. 114.
  6. Goodnow 2007.
  7. Rollings-Magnusson 2012, p. 28.
  8. Berge 2009, p. 232.
  9. Berge 2009, p. 233.
  10. Jagadish 2007, p. 4.
  11. a b Teter, Liu & Kent 1964, p. 1.
  12. a b Jagadish 2007, p. 5.
  13. a b Jagadish 2007, p. 6.
  14. Jagadish 2007, p. 8.
  15. a b c Keable 2012.
  16. Fleming, Honour & Pevsner 1966.
  17. Outlook 2008, p. 38.
  18. Rael 2009, p. 17.
  19. VASCONCELLOS, Silvio de (1979). Arquitetura no Brasil: Sistemas Construtivos. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais 
  20. Oliveira, Bruno Assuncao. «Inserção da taipa de pilão mecanizada com apiloamento pneumático no mercado da construção sustentável no Brasil». hdl.handle.net. Consultado em 20 de setembro de 2017 
  21. «Dissertacao Marcia Helena Yamamoto Sato Capa». Scribd (em inglês). Consultado em 20 de setembro de 2017 
  22. Snell 2004, pp. 27-28.
  23. Lancaster 2005, p. 3.
  24. Snell 2004, p. 28.
  25. Snell 2004, p. 29.
  26. Rael 2009, p. 9.

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